segunda-feira, 20 de julho de 2009

CONTRASTES

CONTRASTES



Após anos de luta, ora galgando degraus, ora descendo-os, buscando sempre mais vitórias e, principalmente, ser feliz, estou chegando ao meu ocaso de maneira melancólica, cheio de dúvidas e de perguntas, talvez mais até do que quando iniciei minha jornada.
Foram momentos de profunda tristeza aqueles, quando me despedi de meus companheiros de regata. Eles voltavam para minha terra natal e eu ficava no Rio de Janeiro, naquela época, uma terra estranha cheia de gente estranha.
Dezenove anos, recém saído da adolescência, cheio de temores, abdiquei do regaço de minha mãe, da convivência com meu pai e meus quatro irmãos para tentar ganhar a vida, sozinho.
Um caminho muito difícil aquele que escolhi para trilhar. Inóspito, muitas vezes asqueroso. Resistindo ao assédio de homossexuais e das drogas, das mulheres infelizes, coroas mal-amadas com contas bancárias recheadas, compradoras de amores. Quem compra amor colhe tristeza e quem dá amor colhe carinho. Felizmente, não me prostitui. Resisti às tentações do vício. Tive disciplina. Nos empregos que trabalhei nunca perdi a hora. Meus alicerces foram calcados em sólida rocha, composta por uma família simples e bem estruturada, a quem devo meu berço e educação.
Falar de si próprio é perigoso. A vaidade, inerente ao ser humano, induz enaltecer nossas virtudes e omitir nossas fraquezas, erros e defeitos. Procuro me vigiar para não cometer esse engano. Pecados, erros e defeitos, possuo-os em demasia, porém o maior deles é amar demais. Amar intensamente a vida, a mesa farta, as mulheres e os amigos. Após sessenta anos, pode-se imaginar quantas derrotas, desilusões e desenganos vivi. Não foram poucos. Espero que não cessem. Mesmo assim é viver. A pergunta é: valeu a pena? O contraste que apaga todo sacrifício está na alegria de ter gerado meus filhos, Lia, Nara e Pedro. Por eles faria tudo outra vez, mesmo que fosse penalizado com mais espinho. O amor deles compensa qualquer outra falta de carinho ou de amor.
Envelhecemos. Embora ainda tenhamos nossas fantasias, os afagos e carinhos vão sendo substituídos pela indiferença e os galanteios, por insultos e rabugices. Em uma de suas célebres canções, o poeta Lupicínio Rodrigues disse: “Esses moços, pobres moços...” e eu diria: “pobres velhos!...” O desprezo e a indiferença tornam-nos verdadeiros e incômodos trastes. Um dia, certamente tudo cessará. Aqueles que deixam grandes heranças serão lembrados de forma efêmera com farras perdulárias e extravagantes. Aos humildes e fiéis, restará o pranto emocional e a eterna lembrança de quem com eles dividiu a miséria. Parece que a necessidade consolida o caráter, enquanto a riqueza em excesso leva à leviandade. São contrastes que a vida nos reserva.

P.S.: Saudades do sempre elegante e solícito dr. Cid Rangel que nos deixa. Tive a honra e o privilégio de gozar da sua amizade. À dona Ruth e filhos, meus sentimentos. Em nossa memória ficarão lições de caráter, profissionalismo e simpatia.

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