CAVALO ARREADO
Manhã de sábado, Parecia que havia engolido uma fogueira tal a ressaca, porém o dever me chamou. Tinha que fechar o caixa do Posto conferindo os encerrantes (números acumulados) das bombas para os frentistas que chegavam em um novo turno. O escritório era uma salinha de vidro transparente na própria pista de atendimento.
A concentração estava péssima! Onde era 96 lia 69 e tinha que refazer a soma toda, Difícil!
Lutando com os números numa batalha insana, chega um motoqueiro com sua moto toda equipada quase que entrou no escritório só não o fez por causa da largura do guidão.
Pensei que fosse um assalto mas logo percebi que se tratava do meu amigo carioca Carlão, amigo de grandes noitadas.
- Vim te ver! Aproveitei a viagem para irmos em Prados trocar um par de botas que comprei lá!
Pensei: Agora danou-se, pois nunca nos encontramos na igreja, sempre nos bares!
Dito e feito! Deixou sua moto no Posto, peguei minha preciosidade, um Landau 78 cinza e teto vinil preto.
Enquanto Carlão trocava suas botas, já o esperei no boteco ao lado. Como sempre fui bem chegado fez-se logo uma chacrinha na porta e dela participaram o maestro da Orquestra de Prados, acho que o tratávamos de “Vademazinho” ou “Ademazinho” cultura refinada conhecia de um tudo, inclusive música.
O atendente do bar, também meu amigo, chamava-se Tiãozinho. Já me recebeu com uma boa pinga especial que mantinha escondida sob o balcão e servia só para os amigos, na outra mão um torresmo também especial.
A prosa estava uma delícia e eu já havia digerido a fogueira do meu estômago mandando a ressaca para o espaço quando o Tiãozinho me chamou em particular:
- “Pedrão pra fazè uma intera no salário, escrevo Jogo do Bicho, dá uma força aí.”
A pule onde escrevia o jogo era numerada. Sem palpite pedi que jogasse o número da pule. Não expliquei direito pedi que fizesse outro jogo. Rasgou aquele bilhete e jogou o número da pule rasgada seco e cercado. O fiz mais com o sentido de ajudar no seu salário. Conversamos mais um pouco e viemos para São João direto para a Cantina do Ítalo.
Na Cantina outro cambista. Meu amigo “Tesourinha” aposentado de uma fábrica de tecidos onde trabalhamos juntos, também usava daquele artifício pelo mesmo motivo “uma intera”. Falou:
- Ainda não fiz nada hoje! Nenhum jogo!
No intuito de ajuda-lo joguei o número da pule de Prados que estava comigo. Enchi a mão, isto é, joguei pesado.
Isso era sábado, acho que corria pela Loteria Federal.
Não lembrei mais, Consciência tranquila de ter ajudado dois amigos
O domingo passou, segunda feira cheguei cedo no “batente”. Muito entretido com os caixas de sábado e domingo, eis que chega o “Tesourinha” até pálido. Sussurrou:
- Você ganhou!
- Então foi coisa boa!
Era tanto dinheiro que dei 10% a ele, comprei passagem de avião e fiquei 30 dias em Belém com carro alugado.
Voltei duro!
Tesourinha falou que reformou a casa dele com os 10%.
Hoje carrego comigo um bastão que ele, bom marceneiro confeccionou para mim.
Lá se vão quarenta anos!
01/02/2024
Pedro Parente
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