sábado, 27 de janeiro de 2018

O BOTO

O BOTO - Lá no alto rio Guamá, nas terras do coronel Hilário, meu avô materno, muitas histórias povoavam minha cabeça de menino.
Distante de Belém seis horas de barco rio acima, no meio da floresta e à beira do rio ficava a casa grande onde meu pai e Feliciano, sua pessoa de confiança, administravam aquela vastidão de terras. Por isso tinham muitos empregados braçais que moravam ali mesmo.
Após o jantar em volta da mesa grande onde sentavam o velho e seu capataz, num banco corrido, sentavam-se os auxiliares. Tudo à luz tosca de lamparinas à querosene.
Nesse clima, começavam as histórias tenebrosas da mata e seus duendes.
Menino, eu ficava de olhos arregalados e coração apertado ouvindo aqueles homens destemidos contarem de seus medos. Muitas histórias. Curupira, Anhangá,
Matinta Perêra, Buiuna, Cobra Grande e etc...
Numa dessas noites chamou-me a atenção a história do Boto encantador de moças.
Contada nas entrelinhas em respeito à minha inocência, pude perceber o seguinte.
As moças que apareciam grávidas sem pai, a família constrangida, atribuía aquela infelicidade ao Boto.
Contavam que nas noites de festa, aparecia um moço bonito de terno claro e de chapéu.
Exímio dançarino encantava as moças que ali estavam. O detalhe é que nunca tirava o chapéu da cabeça, pois boto tem um buraco no meio da cabeça que faz parte do seu sistema respiratório.
Repentinamente desaparecia deixando sua parceira de dança amargurada.
Meses depois o resultado daquele encontro nascia.
Ouvia aquilo tudo com a maior atenção e de boca aberta, naturalmente.
O que hoje me admira é que essas histórias eram contadas por homens sérios, austeros chefes de família incapazes de mentir.
Um deles, Simão me contou que certa noite, muito calor sem sono saiu de sua rede e foi admirar o luar na cabeceira do trapiche.
De longe avistou um cidadão encostado num esteio. Pensou consigo em bater um papo com ele.
Quando foi chegando perto, o homem pulo dentro do rio. No mesmo instante boiou um boto que deu aquela respirada pelo suspiro da cabeça.
Pedro Parente
27/01/2018

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