sexta-feira, 24 de julho de 2020

MARINHEIRO ESCANDINAVO MUTILADO DE GUERRA

MARINHEIRO ESCANDINAVO MUTILADO DE GUERRA.

Nos saraus de fins de semana, Dr. Evaristo de Moraes Filho proeminente jurisconsulto famoso no Brasil, inclusive foi um dos que fez a defesa do Color em seu impeachment, convidou Flávio e Violeta para irem a seu apartamento suntuoso na praia do Flamengo para uma noite de vinhos e queijos, recomendou que levassem a “turma do violão”.
Assim foi que, no dia marcado, sábado à noite, lá fomos nós! Eu, inclusive, na “turma do violão”. Flávio não me deixava para trás.
Fomos: Flávio, Violeta, Turquinho, Kate, Thompson, eu e Bené, este um cearense de sotaque carregado bom de violão e de prosa.
Haviam mais convidados do Evaristo pessoas simpáticas e bem educadas apreciadoras do cancioneiro popular brasileiro que Violeta dignificava com sua voz e molejo inigualáveis.
Em um canto da sala uma mesa redonda lotada de com fatias generosas dos melhores queijos nacionais e internacionais. Compondo a decoração da mesa, imagens de santos católicos entalhados na madeira.
Muito chique!
Tive até receio de me aproximar, pois não sabia se os queijos eram para nós ou para os santos, numa espécie de oferenda.
Acho que passou a mesma coisa pela cabeça do Bené.
Já lá pelo terceiro ou quarto uísque, Bené perdeu a timidez com um copo em uma das mãos e violão na outra não sabia o que fazer para tocar, pois precisava de ambas as mãos livres.
Dirigiu-se ao dono da casa com aquele sotaque carregado e disse:
- Ó doutor! Que os santos perdoem meu sacrilégio, mas posso colocar meu copo de bebida alcoólica na mesa?
O consentimento do Evaristo veio entre gargalhadas!
Ambiente de muita alegria, todos felizes as conversas já em tom maior acompanhando o grau da bebida, Flávio combinou comigo que iria se caracterizar de marinheiro escandinavo mutilado de guerra que estava recolhendo fundos para sobreviver sem um dos braços.
Violeta acompanhou-o. Arrumaram um paletó do Evaristo, um guarda chuva fechado introduzido pela manga do paletó substituindo o braço perdido na guerra. Uma vassoura apoiada no queijo ocupava o lugar de um violino e uma varinha na mão direita que seria o arco de tocar o instrumento.
Pedi silêncio aos comensais e anunciei a presença do marinheiro que de marujo só tinha o boné.
O “marinheiro” reverenciou a plateia naquele gesto tradicional, curvando o tronco para a frente.
Começou a apresentação!
Com passos claudicantes e muito lentos, o “marinheiro” foi tocando seu instrumento, passando a varinha no cabo da vassoura apoiado pelo guarda-chuva dentro da manga do paletó do braço esquerdo.
Bené executava a Marcha Fúnebre!
As pessoas com cara de paisagem, não sabiam ao certo do que se tratava.
Encerrada a apresentação, o marujo quis saudar e agradecer aos presentes com um aceno de mão direita, porém, ela segurava o arco do suposto violino.
Todos atentos e em silêncio.
O “marinheiro” sem saber o que fazer com o arco, de repente, da braguilha de sua calça vai saindo uma coisa com movimento próprio.
Ninguém piscava!
Eis que surge por inteiro o dedo do “marujo” que o Flávio havia colocado por dentro da calça em posição estratégica, segura o arco e ele pode então cumprimentar a todos entusiasticamente.
Aí o mundo veio a baixo. Todos descontraíram e adoraram o desfecho.
Todos à mesa para devorar os queijos e beber aqueles vinhos deliciosos. Por pouco o Bené não comeu um Santo.
Grande noite!
Saímos de lá com os alvores do dia.
24/07/20
Pedro Parente





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