quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

O Mouco

 O MOUCO.

Lá pelos anos cinquenta, quando ainda morávamos em Belém, era comum recebermos em casa parentes vindos do interior em busca de colégios mais qualificados a fim de ampliar seus conhecimentos.

Nossa residência era na Praça do Relógio nas Docas do Ver-o-Peso. Um sobrado alto de três andares onde ocupávamos o último andar.

Éramos cinco irmãos, todos homens papai e mamãe. Apesar da família não ser tão numerosa, havia espaço suficiente para outra família pois a casa era enorme. Sua construção ia de uma rua à outra.

A família de meu pai, vinda da Itália, estabeleceu-se em Abaeté depois denominada Abaetetuba devido a coincidência de cidade homônima em Minas Gerais. 

Nós adolescentes, gostávamos quando vinham primos pra morar conosco. Mais um pra participar das nossas brincadeiras e molecagens.

Foi nessa situação que chegou em casa trazido pelo papai oriundo do Seminário, o Edgard.

Um rapaz franzino com trejeitos de educação seminarista, franzino, porém muito agitado. Devido ao regime de colégio interno, não fazia ideia do mundo profano. Muito educado para tratar com alguns trogloditas.

Não tínhamos geladeira e então tínhamos que comprar as coisas diariamente. Ir a feira era um ritual diário.

Mamãe aproveitava essa mão de obra cheia de energia, nos botava pra trabalhar.

Eu gostei muito pois iria dividir meu oficio com o primo Edgard. Um ia comprar os legumes na feira e o outro ia ao “talho” (nome dado hoje aos açougues). Chamava-se “talho” porque o açogueiro repartia as partes da reis com o machado em cima te um toco imenso de árvore centenária.

Normalmente trabalhava sozinho, por assim ser e reflexo da profissão, eram brutos e de corpo avantajado. Cortavam a carne e com a mesma mão recebia e fazia o troco do dinheiro recebido. Não havia cartão de crédito.

Certo dia dividimos as incumbências, eu fui à feira e o Edgard ao “talho”. Normalmente tinha fila para atendimento.

Quando voltei da feira com as compras numa cesta de palha, o primo ainda não tinha voltado.

Estranhei! Passado um tempo, ele chegou esbaforido, suado e nervoso.

Mamãe do alto de sua austeridade, perguntou-lhe porque estava nervoso?

Ele então contou que a fila estava muito grande e passou alguns em sua frente.

Aí deu-se um diálogo interessante:

- Também falei tudo que queria com o açougueiro!

- E ele não retrucou nada? São pessoas estúpidas!

- NÃO! ELE NÃO OUVIU!

10/01/2023

Pedro Parente

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