sábado, 13 de setembro de 2008

URUBU-REI

CAUSOS DO SALÃO



No final dos anos quarenta, aconteceu um fato com meu pai “Zé do Cercadinho”.
Ele gostava de se fantasiar nos carnavais e sair com a “Turma do Zé Pereira”, grupo de fantasiados que circulavam pelas ruas do centro de São João.
Papai gostava de caprichar na indumentária, e naquele ano pegou um mantô preto e comprido, de pelos brilhantes, grosso e quente pacas. Colocou uma peruca feita com cabelos de milho, óculos escuros, um par de botas pretas e, com a ajuda de minha mãe ele se fantasiou e saiu.
As recomendações de sempre:
- Cuidado! Não beba muito e não faça igual aos outros anos. Volte hoje!
- Pode deixar que eu não vou virar a noite, não!
O que minha mãe não imaginava, é que uma hora depois, papai chegou em casa danado da vida, dizendo que ia trocar a fantasia. Sem explicar muito ele disse que tinham posto um apelido que ele não gostou e, como tava virando gozação ele resolveu voltar.
Arrumando um lençol fez um turbante tipo árabe, colocou os óculos pretos, um outro paletó, também preto, calção branco sapato e meia ¾ e tornou a sair. Mas como ele não havia dito o apelido recebido, mamãe, curiosíssima perguntou:
- Qual foi o apelido José, que te deram?
Ele com a maior cara de cínico, disse:
- Me chamaram de parteira e eu não gostei.
Ai foi a vez de minha mãe, dando boas risadas dizer:
- Então vai pra farra seu URUBU-REI.
Lalado

ZÉ DO CERCADINHO

“Um Lorde são-joanense”

“Meu nome José Vicente da Silva, vulgo “Zé do Cercadinho”“.
Cheguei aqui em São João del-Rei, no ano de 1936, sou nascido em Cachoeira do Brumado, município de Mariana, em 25 de junho de 1912, de família pobre.
Minha mãe, doceira e cozinheira, de mão cheia, conhecidíssima naquela região, conseguiu através de amigos, colocar-me no Instituto João Pinheiro, onde estudei e saí de lá com emprego na mão.
Vim para essa cidade querida, como Observador Meteorológico, vindo trabalhar no posto meteorológico, que ficava aqui no Bairro do Bonfim. Constitui família, aqui tendo oito filhos saudáveis e queridos, por todos.
Em São João del-Rei, tive o privilégio de participar de várias atividades; no esporte, joguei no Athletic Clube, Minas Futebol Clube( sendo o mais querido ) e Bandeirantes aqui do Bonfim. Participei da 1ª corrida do Fogo Simbólico em nossa cidade, corria nas competições locais, ganhava algumas. Outras só perdia para o Paulo Cristófaro.
Fui membro da Banda de Música Santa Cecília fundada em 1932, pelo Sr. Joaquim Lauriano, mestre competente e exigente. Essa Banda fazia tocatas por toda a região, contava com aproximadamente trinta músicos de boa categoria. Tínhamos bons instrumentistas, um que se destacava bastante era o saudoso “Totonho Riquinta” , apelido adquirido pelo fato de executar sua requinta com afinação perfeita e em volume de som inacreditável. Hoje, eu nos meus noventa e seis anos, sou o único vivo, entre os que compunham aquela magnífica Banda de música. Alguns mais novos na época, como o Capitão Parreira, também fez parte da Banda, até ir aos 18 anos, para o Exército onde se tornou um belo clarinetista, a mestra da gloriosa Banda do 11ºRI.
Há 40 anos, fui um dos fundadores do Grupo “Alcoólicos Anônimos” em nossa cidade e colaborador na criação de tantos outros em nossa região.
Sou carnavalesco, toquei em clubes, ranchos e bandas carnavalescas, como, “Custa mais vai”, ”Bate Paus“, “Bandalheira” e a Banda Municipal, até o ano de 2002.
Hoje afastado de todas essas atividades, curto minha vida ao lado de minha companheira D. Dadinha, que me tem muita atenção e carinho. Impossibilitado de falar, pois em 1988 fui submetido a uma cirurgia na laringe, ela transformou-se em minha porta-voz. Mas sempre agradeço a Deus pelos anos vividos, pela esposa, que tive ao meu lado por trinta e oito anos. Agradeço, também, aos filhos, netos e amigos. Agradeço “ao “Jornal Pérolas do Samba”, por esse presente que esta me dando”.
PS. - Este é o depoimento dessa figura folclórica do Morro da Forca, admirado por todos, especialmente pelo seu bom humor. Numa roda de conversa ninguém ficava triste, Zé tinha sempre um caso interessante para contar.
Lembro-me quando estivemos juntos, antes de ser submetido à cirurgia que lhe privou da fala. Estávamos no ponto do ônibus, juntamente com outras pessoas que ali esperavam, pacientemente, pelo dito ônibus. O Zé começou a contar um caso, como sempre, muito engraçado. Ele tinha uma maneira própria de falar e gesticular, transformando, às vezes um caso bobo, numa grande piada. Assim foi naquele dia. Aos poucos as pessoas foram se chegando e se assuntando. Não demorou até que se fechasse a roda e o Zé, como não poderia deixar de ser, ao término, foi ovacionada com uma retumbante gargalhada de todos.
Seu apelido: “Zé do Cercadinho” decorre do fato de - como foi dito em seu depoimento - exercer a função de observador metereológico em São João del-Rei.
A estação de meteorologia, funcionava no alto do Morro da Forca e os equipamentos eram protegidos por uma pequena cerca para evitar que alguns animais os danificassem.
Daí as pessoas que se referiam a ele – muito comum no interior – falavam:
- Qual Zé?
- O Zé do Cercadinho. (referindo-se a tal cerca de proteção).
Obrigado pela alegria contagiante com que sempre alegrou a todos nós.
Pedro Parente
pedroparentester@gmail.com