quarta-feira, 27 de dezembro de 2023

quarta-feira, 20 de dezembro de 2023

JUÁ

 JUÁ

Quando o Leblon ainda tinha muitas lembranças do seu antigo casario que começava a ser demolido para dar lugar aos requintados arranha-céus, ainda se mantinha como cartão postal na subida da Avenida Niemayer no final da Delfim Moreira o impávido Hotel Leblon. Ponto de referência de todos nós.
Não havia túnel, o acesso à São Conrado e Barra era feito através de uma sinuosa e perigosa estrada que contornava a montanha.
Na metade do caminho tinha um aconchegante barzinho preferido pelos casais enamorados donde assistiam ao por do Sol.
Não havia nada mais romântico do que o Juá, só que o acesso além de perigoso era frequentado por clientes motorizados.
Eu era louco para ir até lá.
Primeiramente teria que ter uma companhia condizente, com meu salário irrisório teria que resolver dois problemas, a companhia e o dinheiro.
Vida seguindo e eu com aquela ideia na cabeça até que um dia de emprego e desemprego fui trabalhar em um Banco. Ali resolvi os dois problemas, comecei a namorar a secretária do presidente do estabelecimento. Passo seguinte um empréstimo.
A moça tinha situação financeira melhor que a minha e possuía uma Kombi novinha, veículo de trabalho do pai dela. Arquitetei meu plano e num momento de audácia, convidei-a para irmos ao Juá assistir o pôr do Sol.
Comprei roupa nova, brilhantina Glostora nos cabelos, sapato mocassim e com um certo tremor nas pernas, sentei no banco do carona e fomos direto ao Juá sem antes ter passado por alguns sustos naquela via estreita e sem sinalização.
Já vi meu Brasil por vários ângulos, porém aquela tarde foi inesquecível. Tivemos o privilégio de assistir o Sol entrar no mar com nossos corações acelerados de tanta emoção.
Bebericamos uns drinks especiais da casa e a noite caiu de vez. Naquele enlevo perdemos a hora. Já cansados, paguei a conta e fomos ao carro.
Surpresa! Pneu furado!
Lá fui eu trocar pneu! Me lambuzei todo de graxa. Tive vontade de chorar, pois não havia pago nem a primeira prestação do crediário.
Por fim acho que deixei boa impressão, pois namorei a moça por algum tempo. Ela progrediu mais do que eu e passou a desfilar num programa de TV chamado Noite de Gala.
Somos bons amigos até hoje.
Lembranças!
20/12/2023
Pedro Parente
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Pedro Parente

domingo, 17 de dezembro de 2023

LARGO DA SÉ

 


 

LARGO DA SÉ

Esse primeiro prédio de dois andares foi construído pelo meu avô materno oriundo de Portugal que trouxe consigo suas irmãs e bastante dinheiro. Seguiram os passos de nosso “Rei Fujão” pelo mesmo motivo: medo do comunismo.

É uma grande construção confinando seu fundo com a Baia de Guajará onde foi construído, também um trapiche para atracação de sua lancha Leopoldina que transportava gêneros de sua propriedade no Alto Rio Guamá. Na parte de baixo do prédio acontecia a administração e o refeitório da família, Na parte superior haviam dois grandes salões de festas onde eram comemorados aniversários e datas especiais como o Círio de Nazaré, Natal e Ano Novo.

Eram lindas festas! Delas participavam autoridades e a alta sociedade paraense.

Os tempos passaram e aquele prédio serviu de abrigo para sua família até que o Quartel ao lado resolveu se apossar daquela área indenizando a família de forma irrisória.

Restaram lembranças maravilhosas dali.

O prédio foi construído no Largo da Sé, da catedral de onde sai todos os anos a extraordinária procissão do Círio de N.S.de Nazaré padroeira de Belém.

Na família aquele prédio era chamado de Sobrado ou a “Casa da Dindinha” onde minha tia Maria morava com suas irmãs. Por ser professora, na parte de baixo fundou o Externato Barroso que administrava o Curso Primário. Lá estudei, claro que levei vantagem sendo sobrinho da professora...

O Largo era ornado por várias e frondosas mangueiras centenárias. Uma de cada qualidade. Nunca vou esquecer o canto alegre dos bem-te-vis que lá se alimentavam daqueles frutos deliciosos.

A noite Dindinha me levava pelas mãos para a as novenas da Sé onde ela fazia parte do coro entoado as musicas sacras. Na saída um bom sorvete de frutas regionais.

Exausto de tanto brincar nada melhor que uma boa rede e um sono inocente e reparador. Na parede um quadro com a imagem de Santa Terezinha que com seu olhar acompanhava meus balanços.

Só alegria!

17/12/2023

Pedro Parente

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LARGO DA SÉ

  

LARGO DA SÉ

Esse primeiro prédio de dois andares foi construído pelo meu avô materno oriundo de Portugal que trouxe consigo suas irmãs e bastante dinheiro. Seguiram os passos de nosso “Rei Fujão” pelo mesmo motivo: medo do comunismo.

É uma grande construção confinando seu fundo com a Baia de Guajará onde foi construído, também um trapiche para atracação de sua lancha Leopoldina que transportava gêneros de sua propriedade no Alto Rio Guamá. Na parte de baixo do prédio acontecia a administração e o refeitório da família, Na parte superior haviam dois grandes salões de festas onde eram comemorados aniversários e datas especiais como o Círio de Nazaré, Natal e Ano Novo. 

Eram lindas festas! Delas participavam autoridades e a alta sociedade paraense. 

Os tempos passaram e aquele prédio serviu de abrigo para sua família até que o Quartel ao lado resolveu se apossar daquela área indenizando a família de forma irrisória.

Restaram lembranças maravilhosas dali.

O prédio foi construído no Largo da Sé, da catedral de onde sai todos os anos a extraordinária procissão do Círio de N.S.de Nazaré padroeira de Belém.

Na família aquele prédio era chamado de Sobrado ou a “Casa da Dindinha” onde minha tia Maria morava com suas irmãs. Por ser professora, na parte de baixo fundou o Externato Barroso que administrava o Curso Primário. Lá estudei, claro que levei vantagem sendo sobrinho da professora...

O Largo era ornado por várias e frondosas mangueiras centenárias. Uma de cada qualidade. Nunca vou esquecer o canto alegre dos bem-te-vis que lá se alimentavam daqueles frutos deliciosos.

A noite Dindinha me levava pelas mãos para a as novenas da Sé onde ela fazia parte do coro entoado as musicas sacras. Na saída um bom sorvete de frutas regionais.

Exausto de tanto brincar nada melhor que uma boa rede e um sono inocente e reparador. Na parede um quadro com a imagem de Santa Terezinha que com seu olhar acompanhava meus balanços.

Só alegria!

17/12/2023

Pedro Parente

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quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

BAIRRO DA VILA

 BAIRRO DA VILA

O bairro principal da ilha de Mosqueiro, chama-se Vila que concentra o comércio onde todos vão buscar mantimentos para o suprimento de suas casas, por não ter geladeiras para conservar perecíveis, as compras teriam que ser diárias. Por isso aquele local era a parte mais movimentada da cidade, antes do almoço.

Dois amigos Rauland e Mansur sonorizaram a praça usando cornetas alto-falantes fixadas nos postes da “rede elétrica”. Não se perdia nenhuma música gerada em um estúdio precário no quiosque da prefeitura. Muito trabalhoso, pois tudo era feito manualmente. Acabava um LP que hoje chamam “bolachão”, entrava a voz impostada de um dos sócios fazendo reclame do patrocinador. Era época dos “Anos Dourados” e as músicas muito românticas, algumas vindas de Cuba e do Caribe, criavam um clima propício ao namoro e as paixões arrebatadoras dos jovens corações adolescentes.

Havia um salão de danças, comum à época, chamado Praia Bar. Ali os dançarinos exibiam seus passos requintados com suas hábeis damas. Quem não soubesse dançar somente assistia com inveja. Nesse ofício era exigido muita destreza.

É comum nesses arrabaldes seus tipos inesquecíveis. Cada qual com sua peculiaridade; fazia parte desse grupo a Paula. Uma mulher generosa. Ela acolhia aqueles boêmios que prolongavam a esbórnia. Os acolhia em sua casa servindo a eles uma sopa substancial, acompanhada pela “marvada pinga” Com eles amanhecia o dia participando ativamente das conversas. Por ter se prostituido cedo possuía grande experiência no trato com a turma. Não fazia distinção com ninguém e não havia abuso. Todos a respeitavam e acarinhavam. 

Ali havia uma figura muito querida com o apelido de Manteiga. Na época das férias mudava-se de sua casa em Belém para a casa da Paula em Mosqueiro. Trazia a roupa do corpo, a rede e um calção de banho que não tirava durante o tempo que estivesse por ali como hóspede.

Meu amigo Napoleão, companheiro de juventude e que passava as férias conosco, lembrou da “Sopa do Padre Serra”. De padre não tinha nada, a não ser o nome, talvez porque recuperasse o estado normal daqueles que erravam a mão na pinga durante a madrugada.

Cinco da manhã íamos deixar o papai na Vila para pegar o navio que o levava a Belém para trabalhar. Quando voltávamos a pé para casa teríamos que levar temperos e peixes para o almoço, porém antes, uma generosa sopa no Pe. Serra. Não podíamos esquecer de levar o pão para a mamãe.

Após o café da manhã sob austera administração da mamãe, maré cheia, água fresca e uma boa pelada na areia. 

Depois, lauto almoço. Normalmente peixe fresco e de sobremesa um bom açaí. 

Uma boa sesta numa rede na varanda recebendo a brisa fresca vinda das bandas do Marajó.

Não percebia que a vida passava e a felicidade não é perene.

13/12/2023

Pedro Parente


segunda-feira, 11 de dezembro de 2023

VILA DE MOSQUEIRO

 

VILA DE MOSQUEIRO

No dicionário Mosqueiro significa local de muitas moscas, porem a origem do nome dado à ilha, onde passei parte da minha infância, está relacionado a Moquém, uma grelha de paus sobre o lume onde se assam ou secam peixes.

Os índios que ali habitavam  tinham o costume de se reunirem na praia, todos da tribo e promoviam uma imensa pescaria. O produto, normalmente, de bastante volume, contendo quantidade abundante de peixes de todas as espécies. Cabia às mulheres a tarefa de limparem as vísceras e brânquias do pescado. Sendo grande quantidade, a tribo teria que secar os peixes que abasteceriam a aldeia por algum tempo.

Na praia erguiam os moquéns promovendo a secagem. Até hoje por lá se usa o termo “peixe moqueado” que corresponde a “peixe defumado”.

Sendo uma ilha escolhida pela elite, tornou-se muito procurada por turistas que dali fizeram seu passeio de férias e finais de semana. Construíram seus adoráveis chalés de madeira em seus arborizados quintais, cada um mais bonito que o outro.

Por se tratar de ilha sua comunicação e abastecimento com o continente era feita por via marítima. Sua porta de entrada, um trapiche enorme baía adentro onde encostavam embarcações e, principalmente o navio a vapor que trazia moradores e veranistas.

Nas generosas férias escolares o movimento da ilha crescia demais, mantendo as devidas proporções. Ruas de terra, apenas um pequeno ônibus que fazia duas viagens, uma quando o navio chegava e outro quando ia embora.

Ali na frente junto ao trapiche todos chamavam o bairro de Vila, onde tinha o Mercado Municipal. Em frente várias barraquinhas onde as artesãs locais comerciavam seus deliciosos e singelos produtos culinários  como mingaus, tapioquinha, café e mil e uma quitandas

Na minha inocência, achava que ali era o céu!

A tarde tradicionalmente é a hora do tacacá. Um tipo de caldo quente de origem indígena consumido na cuia. Feita com goma de polvilho, tucupi que é o suco extraído da mandioca brava, jambú uma folha que deixa a boca meio anestesiada e camarão seco.

Uma delícia insuperável!

Num quiosque da Prefeitura Tia Raimunda servia em sua banca o tacacá mais famoso e saboroso por isso mesmo muito disputado. Tia Raimunda de seus quarenta anos e talvez cento e cinquenta quilos, sorriso franco, turbante na cabeça, querida de todos. Com todos esses predicados tornou-se conselheira espiritual dos jovens desencantados com seus efêmeros namoricos. Em volta de sua banca tinha sempre uma alegre roda de rapazes e moças alegres como um bando de maritacas.

Tempos felizes!

11/12/2023

Pedro Parente

 

 

 

 

 

quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

MOSQUEIRO

 MOSQUEIRO

Não sei em que século, a Amazônia na região norte do Brasil, houve uma ‘corrida em busca do tesouro”, no caso, tratava-se da borracha extraída de uma planta, a seringueira, nativa daquela região. 

Iniciava-se a explosão industrial com o Henry Ford, nos Estados Unidos, fabricando automóveis em série. Equipados com quatro pneus e um sobressalente aqueceu em demasia o consumo da borracha.

Logo chegaram os empresários, na maioria portugueses, para explorar aquele nicho de mercado. Adquiriram imensos latifúndios, empregaram ribeirinhos e nordestinos que fugiam da seca num regime de escravidão sujeito a todo tipo de intempéries e doenças tropicais como malária, febre terçã, impaludismo causando a morte de um exército de temerários. 

Os patrões logo multiplicaram seus lucros. Muitos cometendo exageros perdulários chegando a queimar dinheiro. Contam que para fazer bonito na presença de cortesãns acendiam charutos cubanos com uma cédula de quinhentos mil reis, a maior da época.

Junto com esse esbanjamento vieram boas novidades como a arquitetura de casas requintadas que algumas recebiam o nome de palácio. A cidade de Belém foi premiada com esse casario. Ainda existem alguns remanescentes de muito bom gosto. Distingue-se aqui o belo Teatro da Paz que abrigou a apresentação das maiores empresas de espetáculo daquele tempo.

Essas famílias abastadas devido ao calor tropical inclemente, gostavam de sair e usufruir de igarapés ou praias de areia. A moral era severa e os patriarcas não gostavam nem um pouco de expor suas mulheres e filhas ao olhar indiscreto de outros banhistas. Elegeram a Ilha de Mosqueiro sua predileta. Ali levaram a opulência de grandes chalés de madeira de lei com arte rebuscada nos detalhes do alpendre.

De colônia de pescadores aquele povoado passou a ser muito procurado por veranistas, tornando-se famoso. Apesar dessa frequência endinheirada até hoje não perdeu seu apodo de “Bucólica”. 

Sendo uma ilha seu acesso era somente via marítima. Tinha um navio ainda a vapor, que fazia o trajeto partindo de Belém. Chegava ao cair da noite em Mosqueiro e voltava de madrugada levando os trabalhadores.. 

Meu pai trabalhava para um banqueiro muito rico que veio de Portugal com sua família fugindo do “comunismo” que comia crianças. (hoje matam as crianças e não comem. A noite estão orando na sinagoga ou na Meca).

Nós éramos cinco irmãos. O terceiro foi atacado por uma moléstia chamada beribéri. A medicina era incipiente. Meus pais desesperados foram aconselhados pelo médico da família a leva-lo para Mosqueiro, pois o clima de lá talvez o salvasse.

Meu pai adquiriu um terreno na Praia Grande e lá construiu uma casa avarandada onde assistimos o milagre da recuperação de meu irmão Guilherme  

As férias escolares gozávamos as delícias daquela aldeia. Eu e meus irmãos passamos a fazer parte da família daquela gente humilde e hospitaleira. Eu era mais um entre eles.

Maré baixa era hora da pelada. Aproveitávamos que a areia ficava certinha. Fincávamos dois sarrafos marcando a trave e o pau quebrava. Os pescadores adultos participavam também. Não tinha nada de aliviar. Certo dia o Chinês errou a bola e acertou a canela do Adamor. Jogo interrompido. Canela quebrada. 

Naquela semana Adamor não pescou. Chinês foi no seu lugar com Crisóstomo e Chico buscar os peixes.

07/12/2023

Pedro Parente





quinta-feira, 30 de novembro de 2023

AVENTURA

 AVENTURA

Lá pelos anos de 1968 na força dos meus 28 anos, pura energia e muita irresponsabilidade próprias da idade, morava no Rio precisamente no Leblon no Edifício dos Jornalistas.

Sem formação acadêmica tinha que trabalhar ali onde não se exigia diploma de nada, apenas boa aparência e educação. O salário remunerava o trabalho de acordo com a função, como eu era “office boy”, hoje “serviços gerais”, ganhava o suficiente para me manter e no final do mês comer um espaguete a bolonhesa e uma cerveja na Espaguetilândia em frente a Cinelândia no Centro. 

Sonhava em ter um carro. Seria impossível com a renda que tinha. Certo dia um amigo levou-me à uma loja de um parente dele que vendia veículos usados no crediário. Encantei-me com um Fusca 1964, bateria de 6v e financiei em um ano. Adaptei dois faróis de milha, tudo fiado. Fiz um empréstimo no Banco pra abastecer o “possante” convidei meu amigo e conterrâneo Rubinho para irmos matar a saudade de Belém e de nossas famílias.

Num domingo de manhã, cedinho, partimos do Jornalistas no Leblon, rumo a Belém. 

O Rubinho, meu amigo, não dirigia. Agarrou-se no suporte de segurança (PQP) no painel em frente ao carona e não tirou os olhos do asfalto sem admirar as paisagens.

Rodamos o dia inteiro e conseguimos chegar em Brasília pela Rodovia 040 já anoitecendo. 

Paramos num muquifo na beira da estrada onde tinha o que procurávamos bar e quarto pra dormir. Tomamos banho, jantamos e fomos deitar. Um quartinho com duas camas de solteiro e a privada lá fora. O travesseiro ainda tinha o afundamento marcado pela cabeça do último freguês. A cama ainda estava quente. Anestesiados pela pinga foi como se estivéssemos num confortável hotel cinco estrelas.

Antes do sol raiar, pagamos e partimos rumo a Anápolis para pegar a Belém/Brasília. Eram 2.000km de terra. Tínhamos que levar gasolina. Ainda não haviam Postos de gasolina suficientes.

O asfalto já tinha chegado até a cidade de Ceres o que já era um prêmio. Quando entramos na terra “o bicho pegou”. O fusca trepidava como se sofresse de Parkinson. As peças iam caindo e nós juntando. Farolete, farol de milha, faróis dianteiros e traseiros, para-choques etc... Tinha mais peças dentro do carro do que fora, além disso para dirigir era o cigarro no canto da boca, mão na direção e a outra na alavanca de mudança para não soltar, pois as “costelas” da estrada desengrenavam a marcha.

A poeira ou piçarra parecia talco. O calor terrível não nos deixava fechar os vidros. Não sei como não entupiu meus pulmões!

Já na “boca da noite” chegamos a um lugar que tinha uma construção de alvenaria com placa de Hotel com banho quente.

Nos entreolhamos e relaxamos. Vamos tomar um banho restaurador e tirar essa poeira toda do corpo. O Rubinho de moreno, parecia alemão com os cabelos amarelos. Tinha poeira até nas pálpebras.

Pegamos nossas toalhas e corremos para o que esperávamos fosse um chuveirão. Ledo engano! Da parede saia um cano de uma polegada de onde escorria um fio de água fria.

Só nos restou improvisar e gargalhar!

Viagem que segue!

20/112023

Pedro Parente.



 







segunda-feira, 27 de novembro de 2023

HERESIA

 HERESIA

Tempos pretéritos aqui na cidade onde moro. Uma cidade do interior de Minas muito famosa por seus tesouros culturais e obras magistrais pintadas ou entalhadas nas belas igrejas barrocas reminiscentes do período da caça ao ouro abundante nas serras e nos córregos de São João del-Rei.

A vida corria mansamente disputando porfia com o córrego do Lenheiros que corta o Centro Histórico. Ninguém era identificado pelo CPF e sim pelo parentesco e também, por apelido.

Assim foi que pela ausência de luz elétrica, todas as casas, principalmente na roça e na periferia, a iluminação era feita com lampiões, candieiros e lamparinas abastecidos com querosene.

Um cidadão simples viu nessa carência uma oportunidade de ganhar um dinheirinho a moda “mineirinho”.

Tinha um caminhãozinho velho. Colocou nele um pequeno tanque de cinco mil litros, encheu de querosene e abastecia  fazendas e as comunidades retiradas, com isso foi juntando  “os cobres” e tornou-se um próspero comerciante no transporte de combustíveis. 

Na época que eu administrava um Posto de gasolina ele possuía duzentos e cinquenta carretas.

O homem era devoto fervoroso de NS Aparecida. Toda carreta zero que comprava, mandava lá no santuário de Aparecida para que o padre benzesse e entronizasse na cabine uma imagem da santa. Exigia respeito dos motoristas à imagem.

Eu tinha um conhecido chamado Fernando que se orgulhava do seu trabalho como motorista de uma das carretas da frota do homem pois era bem remunerado.Motorista muito cuidadoso e asseado, sua cabine era um brinco. Não se via qualquer vestígio de poeira.

Certo dia, quando limpava a boleia da sua carreta, tirou tudo de dentro inclusive a santinha, e colocou no chão para aspirar os bancos.

Não é que o dono das carretas, dando uma fiscalizada no pátio, encontrou a imagem no chão.

Demitiu o Fernando na hora.  

Para o resto da vida ficou com o apelido de 

FERNANDO QUEBRA SANTA.

27/11/2023

Pedro Parente

 



































segunda-feira, 13 de novembro de 2023

OBSERVAÇÃO

 OBSERVAÇÃO

No meu périplo entre bares e restaurantes de diversas cidades que frequentei muito mais do que salas de aulas onde somente o professor falava, observei muito, aprendi muito, ouvi muito e gargalhei demais.

Certa época, quando trabalhava numa fábrica de tecidos, eu e alguns amigos do escritório da administração, fazíamos ponto no bar da Dª. Esther, no próprio prédio da fábrica.

Onde aquela freguesada  toda, formada por gente conhecida era uma alegria só. Todos brincavam entre nos na maior gozação na maior harmonia. 

Nunca houve um entrevero sequer. Ótima confraria!

Nesse clima passávamos horas saboreando as delícias feitas por Dª Esther e suas filhas, entre pingas e cervejas. 

A prateleira de bebidas de dose era sortida até uísque tinha!

Todos os dias ali entrava um rapaz moreno com roupa de grife meio que esnobando a rapaziada. Um gingado diferente e a fala puxando pelo ”xis”. Diziam que estava fazendo sucesso como jogador de futebol.

Sempre sorridente, cumprimentou a todos e fez seu pedido que nos surpreendeu:

- DONA ESTÉU ME DÁ UM ROLABEL!

Nos entreolhamos intrigados e aguardamos Dª Esther servi-lo.

Ela tirou da prateleira uma garrafa do whisky Royal Label muito comum naquela época e sapecou no copo de servir cachaça.

Tomou a talagada duma vezada só, estalou os beiços.

Com uma lágrima no canto dos olhos saiu de fininho.

Contivemos o riso até ele se afastar. 

Achei que usou o dialeto da roça donde veio.

Bar academia da vida!

13/11/2023

Pedro Parente


 


sábado, 11 de novembro de 2023

O BOM VELHINHO

 O BOM VELHINHO

Quando cheguei do Rio de Janeiro vim trabalhar numa fábrica de tecidos. Não me passava pela cabeça que no setor industrial, a administração trabalha, também aos sábados.

Não tinha o menor cacoete. Não estava acostumado. No Rio trabalhava só até sexta..

A salvação é que no próprio prédio da fábrica havia um barzinho administrado pela simpática Dª Esther e suas filhas. Ela havia sido operária durante muitos anos.

Aos sábados comecei a frequentar o bar e corrompendo alguns companheiros de serviço passávamos horas bebendo e comendo as delícias feitas por mãos habilidosas. O patrão não gostava mas como eu fazia parte da administração ele relevava.

O bar é um lugar democrático. As pessoas tem direito de falar o que quiser, sentar com quem quiser, morrer de rir e alguns insensíveis que não sabem beber, se exaltarem tornando-se inconvenientes.

Nesse bar nunca presenciei nenhuma desavença, pelo contrario só alegria.

Nesse clima angariamos a simpatia dos frequentadores e formamos uma pequena comunidade

Tinha um velhinho que caminhava com muita dificuldade apoiado por duas muletas, Para ganhar um dinheirinho a mais, escrevia jugo do bicho. Penalizados por sua dificuldade de locomoção nos cotizamos e lhe demos uma cadeira de rodas. Ficou numa alegria imensa. Todos tinham carinho por ele.

Certo dia chegou um cidadão e humilhou o velhinho.

- Vou jogar uma mixaria. Não jogo mais porque o senhor não paga.

O sangue me subiu na cara. Tirei um bom dinheiro da carteira e insultei o cara:

- Joga ai essa grana. A “salva” é sua!

O cara olhou sem graça e saiu de fininho.

As forças cósmicas conspiraram a meu favor. Ganhei a centena. Era muito dinheiro. O coitadinho não teve coragem de descer de sua casa com aquela grana toda.

Me levou em sua casa e deu um pacote com os montinhos amarrados pelo tradicional elástico.

Tirei um dos pacotinhos e lhe dei de presente.

Relutou em aceitar.

Com o dinheiro fui a Belém ver minha família.

Quando retornei, o bom velhinho me ofereceu o dinheiro dizendo que não havia mexido e que estava a minha disposição.

Boas lembranças de bons momentos.

Só saudade!

11/11/2023

Pedro Parente

 

 

Quando cheguei do Rio de Janeiro vim trabalhar numa fábrica de tecidos. Não me passava pela cabeça que no setor industrial, a administração trabalha, também aos sábados.

Não tinha o menor cacoete. Não estava acostumado. No Rio trabalhava só até sexta..

A salvação é que no próprio prédio da fábrica havia um barzinho administrado pela simpática Dª Esther e suas filhas. Ela havia sido operária durante muitos anos.

Aos sábados comecei a frequentar o bar e corrompendo alguns companheiros de serviço passávamos horas bebendo e comendo as delícias feitas por mãos habilidosas. O patrão não gostava mas como eu fazia parte da administração ele relevava.

O bar é um lugar democrático. As pessoas tem direito de falar o que quiser, sentar com quem quiser, morrer de rir e alguns insensíveis que não sabem beber, se exaltarem tornando-se inconvenientes.

Nesse bar nunca presenciei nenhuma desavença, pelo contrario só alegria. 

Nesse clima angariamos a simpatia dos frequentadores e formamos uma pequena comunidade

Tinha um velhinho que caminhava com muita dificuldade apoiado por duas muletas, Para ganhar um dinheirinho a mais, escrevia jugo do bicho. Penalizados por sua dificuldade de locomoção nos cotizamos e lhe demos uma cadeira de rodas. Ficou numa alegria imensa. Todos tinham carinho por ele.

Certo dia chegou um cidadão e humilhou o velhinho.

- Vou jogar uma mixaria. Não jogo mais porque o senhor não paga.

O sangue me subiu na cara. Tirei um bom dinheiro da carteira e insultei o cara:

- Joga ai essa grana. A “salva” é sua!

O cara olhou sem graça e saiu de fininho.

As forças cósmicas conspiraram a meu favor. Ganhei a centena. Era muito dinheiro. O coitadinho não teve coragem de descer de sua casa com aquela grana toda. 

Me levou em sua casa e deu um pacote com os montinhos amarrados pelo tradicional elástico.

Tirei um dos pacotinhos e lhe dei de presente. 

Relutou em aceitar.

Com o dinheiro fui a Belém ver minha família.

Quando retornei, o bom velhinho me ofereceu o dinheiro dizendo que não havia mexido e que estava a minha disposição.

Boas lembranças de bons momentos.

Só saudade!

11/11/2023

Pedro Parente



FLOR DO GUAMÁ

 FLOR DO GUAMÁ

Vivia a fase dourada da juventude. Faz muito tempo! Ainda sob a proteção de meus pais e a companhia de meus irmãos de uma prole de cinco homens.

Não faltava trabalho eu o fazia prazerosamente com o ufanismo de ajudar meu velho pai. 

Meu avô materno, português, adquiriu uma quantidade enorme de terras no alto rio Guamá a ponto de tornar-se Cel. da Guarda Nacional um título honorífico adquirido do Governo em moeda corrente. Desta forma tornando-se responsável pela segurança naquelas terras.

O casarão sede do que naquelas bandas chamam de “sítio” embora numa gleba de terras de trinta mil hectares. Era todo de madeira da própria floresta. Um imenso chalé avarandado que comportava venda de produtos para manutenção das casinhas dos colonos. Não existia eletricidade, as lamparinas e candeeiros eram abastecidos com querosene.A casa abrigava muitos daqueles que eram empregados do sítio e moravam ali. Os casados com suas esposas.

Na frente da casa havia um trapiche onde encostavam as embarcações trazendo ou levando produtos e passageiros.

Tínhamos duas embarcações que transportavam a colheita de arroz, cacau, e outros produtos da floresta. Um barco movido a motor Diesel e uma grande canoa à vela. O barco chamava-se Pingas e a canoa Flor do Guamá. Meu pai se orgulhava dos dois, pois eram imbatíveis nas porfias.

Em certo momento, no auge da safra, o Pingas teve que ser recolhido ao estaleiro para reparos emergenciais, calafetagem do casco e pintura. Dessa forma o trabalho da Flor do Guamá triplicou e causou certa apreensão, visto que dependíamos agora não só da maré mas também do vento.

Teríamos que concatenar maré e vento. No Pingas fazíamos a viagem em seis horas, isto é, uma maré. Na Flor do Guamá teríamos que contar com o vento e de que lado ele viria.

Operar essa canoa era difícil e exigia muito do piloto e da tripulação. A vela latina feita de lona, tinha um peso enorme devido seu tamanho. Era içada pela verga superior. Na verga inferior ficava presa a escota, um cabo que dá direção à vela quando “camba o bordo”, isto é, muda de direção. No bico de proa a bujarrona uma vela triangular que ajuda no impulso e nas manobras.

Numa dessas viagens, maré fraca de Lua nova o vento apenas uma aragem, desatracamos do trapiche na reponta da maré, isto é, no limite máximo da maré cheia.

Nossa esperança era alcançar o Ver-o-Peso de uma vez só, porém nem o vento e nem a correnteza não foram suficientes para nosso intento.

A maré encheu e com o vento fraco não conseguiríamos vencer a enchente. Era na caída da noite. Jogamos a âncora e ficamos fundeados.

No passadiço Coló um tripulante esperto, acendeu o fogareiro de barro, colocou  uma lata de vinte litros com água pra ferver, jogou umas cebolas, cheiro-verde, coentro e chicória e fomos todos, com linha de mão pegar um peixe para o jantar.

Pegaram uma piramutaba grande. Limparam-na e jogaram os pedaços grandes na lata fervendo que já tinha apurado aquele caldo cheiroso. Farinha no fundo do prato de folha (esmaltado) o tal “pirão escaldado” que nosso povo ama.

Barriga cheia, uma soneca esperando a maré vasar para chegarmos à feira. Descarregamos à canoa e voltamos para o sítio Canta Galo.

Corpo cansado e o coração feliz.

11/11/2023

Pedro Parente. 

 




quinta-feira, 29 de junho de 2023

GLADIADORES

 GLADIADORES

Ariano Suassuna, intelectual e entre outros méritos, poeta, teatrólogo; autêntico sertanejo paraibano, autor da peça teatral “O Auto da Compadecida”, dizia que as personalidades que mais admirava eram a do doido e do mentiroso.

Temos alguma afinidade, pois gosto muito de ouvir histórias contadas por estes personagens. 

Foi assim que certo dia, a sombra de uma mangueira frondosa encontrei com um velho amigo e pegamos a prosear. 

Contou-me que havia aqui na simpática cidade de S. João del-Rei dois homens de musculatura possante de impor respeito a qualquer mortal, com um porém, eram desafetos, inimigos figadais. Não podiam se encontrar que era desavença na certa!

Numa manhã ensolarada de domingo a cidade amanheceu em festa, pois em cerimônia oficial o Prefeito da cidade iria inaugurar a pavimentação com bloquetes de concreto, a avenida principal. A “Furiosa” apelido da banda de música municipal, bandeirolas e som ambiente através de cornetas dependuradas nos postes de iluminação pública davam um ar festivo e alegre aquela efeméride.

O narrador do “causo” foi se empolgando com minha atenção que a veia do pescoço dele dilatou e as maçãs do rosto enrubesceram.

Aí aconteceu o inesperado encontro dos dois desafetos. A discussão foi aos berros, pareciam dois touros enfurecidos a disputar o comando da manada.

Um deles deu um soco de cima pra baixo no adversário com tanta violência que ao errar o alvo, socou um dos bloquetes tirando-o fora do lugar.

Fiz cara de espanto que provocou a alegria no semblante do “contador de causo” que não sei como classifico? 

MENTIROSO ou DOIDO. 

29/06/2023

Parente Pedro





quarta-feira, 28 de junho de 2023

TRAVESSIA

 TRAVESSIA

Era uma vez... final dos anos cinquenta no cais do porto em Belém.

Atracado ao cais, estava o “Pingas”, um barco de porte médio equipado com motor de centro Bolinder de 30HP fabricado na Suécia, pois a indústria naval brasileira apenas engatinhava.

Sua capacidade de carga era em torno de cinco toneladas. Estávamos carregados com latas de querosene de 20 litros e nosso destino era a cidade de Soure na Ilha de Marajó onde o querosene era uma fonte de energia com várias utilidades. Até geladeira funcionava com essa energia, lembro-me até da marca “Gelomatic”.

Nosso projeto era vender o querosene e voltar com produtos marajoaras a fim de vendê-los na feira do Ver-o-Peso em Belém.

A maré repontou, - fim da enchente e início da vazante quando o rio devolve suas águas rumo ao oceano, nessas condições facilitando nossa navegação a favor da correnteza.

Eram catorze horas. Soltamos as amarras com motor acionado a meia força, leme a bombordo rumo NE. 

No leme ou timão Feliciano homem de confiança do meu pai. Personalidade tranquila, voz calma mas impunha grande respeito a seus comandados, profundo conhecedor da navegação de correntezas, remansos, rebojos e de canais. Na “casa de máquinas” Talico homem miúdo, esperto que conhecia as manhas do motor que tratava com o carinho que se dedica a uma pessoa amiga.

O resto da tripulação era composta de caboclos fortes curtidos pelas intempéries próprias da região. Éramos oito ao todo.

Navegávamos tranquilamente. O tempo foi passando e a noite caindo com ela a escuridão e a confusão do lusco-fusco quando não se sabe se é dia ou noite.

É normal, nessa hora, o vento Geral. Muito forte que sopra do mar para o litoral e com isso as águas da baía se transformam e a superfície fica “mexida” com banzeiros em toda direção como se estivesse em ebulição.

As luzes de navegação foram acesas. Uma branca no topo do mastro, a esquerda (vermelha) bombordo e a direita (verde) boreste. Luz branca de popa com os devidos anteparos.

A navegação, de repente tornou-se perigosa! Notava-se no semblante daqueles homens destemidos muita preocupação.

Já havíamos deixado o farol da Ilha de Mosqueiro à popa e já avistávamos à proa o farol do povoado de Joanes quando alguém gritou:

- Homem ao mar!

Noite escura sem Lua, somente as estrelas testemunhavam o desespero de todos, mas Feliciano manteve a calma. Mandou desligar o motor, ordenou que todos fizessem em silêncio e deu um grito alto que foi respondido ao longe. Ligou o motor imediatamente e prumou para o rumo da resposta orientado pelo seu instinto de velho marinheiro.

Achamos o tripulante!

Numa cena emocionante vi aquele bravo homem rude de mãos calejadas e tez sulcada pelo Sol abraçar seu filho e copiosamente chorarem como crianças.

Corremos o risco com o barco carregado à deriva mas valeu a pena.

De volta numa viagem tranquila vendemos nossa carga no Ver-o-Peso e fomos comemorar com açaí e peixe frito.

Senhora dos Navegantes olhou por nós!

28/06/2023

Pedro Parente

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terça-feira, 30 de maio de 2023

BOLOR

 BOLOR

Era uma vez... numa simpática cidade histórica do interior de Minas, São João del-Rei onde escolhi para morar.

No auge dos meus trinta anos, logo me enturmei com a rapaziada da boemia e das boas prosas e ótimos “causos”, assim foi que conheci o Bolor apelido dado aquela pessoa singular. 

De boa família austera e tradicional, optou em levar sua vida à seu modo não dando ouvido aos mais velhos que tentavam direcionar a vida dele.

Muito ladino e sagaz vivia sua vida usando de pequenos expedientes muitas vezes ilícitos aos olhos da sociedade. Todos gostavam dele pelo seu jeito educado e respeitoso de lidar com as pessoas.

Era comum vender uísque importado e todos sabíamos da sua perícia em refazer os lacres de chumbo de garrafas usadas

Certo dia o convidei a tomar um uísque e quando me dirigia pra determinado bar em sua companhia, falou-me:

- Aí não! Esse é dos meus!

Era comum quando as pessoas se referiam a uísque de procedência duvidosa, que era de “fabricação do Bolor!”

O fato tornou-se conhecido de todos até que um dia chegou ao ouvido do Delegado de Polícia.

Chamou-o “sob vara” e pediu que esclarecesse aquele rumor de adulteração de produto importado.

Bolor sabia dos meandros da Lei, quando perguntado, declarou ao Delegado:

- Doutor não adultero, apenas transponho um uísque nacional para um recipiente importado elevando seu status. Isso não é crime.

O Delegado gente boa sorriu e alegou que era crime contra a economia popular e o mandou prestar serviço por determinado tempo à uma comunidade carente.

Saudade do meu amigo!

30/05/2023

Pedro Parente 


sexta-feira, 19 de maio de 2023

CAUSO DO IVO

 CAUSO DO IVO

Morávamos num prédio de doze andares no Centro de São João del-Rei, no térreo havia uma cantina italiana, Cantina Calabresa. Seu proprietário era um simpático casal Ítalo e Lina oriundos da cidade de Paola/Cosenza. Trouxeram consigo, além do fino trato no atendimento de seus clientes, a arte da gastronomia daquele lugar. 

Irresistível atender ao chamado do Ítalo para provar seu tira-gosto antes do almoço.

Quantas vezes mudei de rumo! Vinha pelo outro lado da calçada com intenção de subir sem parar para o “antepasto”, porém o Ítalo dominava o movimento da rua com perfeição de quem fora “carabineri” durante a guerra. 

Do outro lado da rua ouvia seu convite com a voz inconfundível de tenor, já com um pedacinho do delicioso pernil fresquinho:

= Pietrino veni qui!

Naquela hora, minha boa intenção desaparecia dando lugar aos sorrisos e abraços dos amigos que ali estavam. Sem delongas pedia “umazinha” guardada debaixo do balcão e continuava a prosa.

O restaurante tornou-se um sucesso e as famílias aos domingos, reuniam-se em torno de uma bela macarronada, canelone e  outras delícias romanas.

Aproveitando a onda de sucesso e atendendo a solicitação da freguesia, passaram a fabricar massa e vende-la no varejo pré-cozida.

Meu grande amigo Ivo Nohra, assíduo confrade. Professor de desenho industrial, mas a arte que mais eu admirava era seu jeito único de contar “causos”. Ninguém ficava sério perto dele.

Contou-me que, certo domingo, sozinho em casa, resolveu fazer uma macarronada a seu modo.

Na Cantina, comprou meio quilo de talharim, massa fresca pré-cozida e levou pra cozinhar, pois morava no décimo segundo andar. 

Desceu de elevador e foi tomar mais uma enquanto a massa cozinhava.

Bateu-lhe a curiosidade e perguntou à Carmelina:

-Quanto tempo leva pra cozinhar a massa?

- Dez minutos!

Ficou decepcionado, pois havia deixado o macarrão cozinhando na panela de pressão!

Esse era o Ivo! Impagável!

Muita saudade!

19/05/2023

Pedro Parente



quarta-feira, 17 de maio de 2023

RECORDAÇÕES

 RECORDAÇÕES

Corriam os anos sessenta, Edifício dos Jornalistas no Leblon onde eu morava. 

A turma era grande e a felicidade constante.

Dentro do condomínio rolava uma pelada que se tornou famosa a partir do momento que ali participavam Newton Santos e Garrincha. 

O dono da bola era o Murilo Asfora que nos deixou recentemente levando consigo um pedaço do que resta do meu combalido coração. 

Este é um momento triste, porém prefiro ficar com as boas recordações daquela época.

Murilo tinha um irmão, Lúcio que devido a grande empatia, nos tornamos íntimos. Era uma pessoa muito engraçada, dessas que possuem um jeito peculiar de contar seus casos. Sempre que encontrávamos me saudava com uma frase em italiano:

-“Domani sarà tropo tardi!”. Dizia que fazia parte de um filme protagonizado por Frank Sinatra. 

Impossível conter a gargalhada!

Contou-me que seu tio veio do Nordeste, acho que de Recife, para visitar a família do irmão Permínio.

Certa manhã aquele senhor circunspecto, decidiu conhecer o Centro do Rio. Pegou um “troleybus” que substituiu os bondes e desceu próximo a Avenida Rio Branco com o intuito de caminhar e admirar aquelas preciosidades do Rio.

Ao atravessar a Avenida Presidente Vargas o sinal luminoso abriu e não deu tempo de alcançar a calçada do outro lado.

Oito pistas de carros e lotações verdadeiros bólidos a porfiar uns com os outros.

Nosso ilustre visitante não teve dúvida, desesperado ajoelhou-se no meio da pista e com as mãos para o céu gritava:

-Parem! Parem que eu não sou daqui!

Quando o sinal fechou novamente, conseguiu chegar ao outro lado da pista, pegou um taxi interrompendo sua visita antecipadamente.

Momentos felizes!

17/05/2023

Pedro Parente


quinta-feira, 4 de maio de 2023

desatenção

 DESATENÇÃO

Na caminhada nesta jornada pela vida breve, muitas vezes passam despercebidos fatos muito interessantes.

A minha caminhada foi longa em quilômetros, pois vindo de Belém. até chegar aqui foram mais de três mil quilômetros. 

Fiz uma escalada de dez anos no Rio de Janeiro para poder adquirir a simpatia, hospitalidade e a “malandragem” do carioca.

Hoje nas minhas lembranças, veio-me à tona, um grande amigo garçom que me atendeu, esse tempo todo, nas minhas noites de boemia no Garden Bar no Leblon. 

Seu nome Napoleão. Pessoa humilde, gentil, educado e generoso. Pessoa de confiança do proprietário que algumas vezes o substituía. Morava em N. Iguaçu. Atravessava a cidade para trabalhar, praticamente morava na condução.

Certas horas tomava conta de mim, ficava observando até eu chegar no meu prédio de moradia.

Conversávamos muito. Com ele aprendi a olhar em minha volta para aqueles que nos servem e nos assistem.

Quando vim para Minas sempre que ia ao Rio, em primeiro lugar ia vê-lo.

Me dava notícia de todos os companheiros frequentadores daquela época. Numa dessas idas me comunicou que um de seus filhos havia se formado em medicina.

Fiquei feliz. Naquela época filho de pobre formar em medicina era muito mais difícil que hoje.

Seu sacrifício não foi em vão. O tenho como exemplo de abnegação pelo prêmio da conquista de seu filho.

Onde estiver meu amigo vai meu abraço e minha lembrança. 

04/05/2023

Pedro Parente


segunda-feira, 24 de abril de 2023

EXTRASSENSORIAL

 EXTRASSENSORIAL

Corria o ano de 1965 eu trabalhava no Banco Irmãos Guimarães no Rio de Janeiro, precisamente na Rua Sete de Setembro com a Gonçalves Dias, próximo a famosa Confeitaria Colombo.

Com 25 anos de idade carregava comigo a beleza e o vigor da juventude. 

Tudo alegria.

Os amigos de trabalho eram irmãos queridos, mas como a felicidade nunca é completa tinha um sub gerente (sub é um qualificativo não recomendável) que destoava.

A noite, em casa, recebi um telefonema de uma senhora com quem mantinha pouco convívio. Explicou-me que desenvolvia mediunidade numa “mesa branca” kardecista em Ipanema e que meu nome havia sido citado naquele local. 

Pedia minha presença numa certa terça feira a tarde.

Fiquei preocupado! 

Era dia de trabalho. Não poderia faltar, mas como sou muito preocupado, não poderia deixar de atender aquela senhora e também à minha curiosidade.

Tomei coragem e fui ao gerente Dr. Mário pessoa de fino trato e lhe contei o meu problema. Coincidentemente ele era praticante daquela seita. Concedeu-me a licença de faltar ao expediente da tarde e lá eu fui

Ressabiado entrei por um corredor estreito até um grande salão térreo uma mesa redonda com sete senhoras de guarda-pó em sua volta. Na minha vez todas se levantaram e de mãos dadas invocaram suas entidades. 

Tomei um susto!

Das sete senhoras, cinco incorporaram, uma delas uma velhinha baixinha com deformidade no osso do peito proeminente (peito de pombo) pulava feito sapo. 

Atônito observava aquilo com o coração disparado. 

Daquelas senhoras, duas permaneceram serenas. Uma segurava minha mão direita e a outra a esquerda.

Fui surpreendido pela voz da minha vó italiana que morava em Belém.

Voz de vó nunca se esquece, principalmente da minha com seu sotaque italiano.

Disse-me que estava em bom lugar, respondendo à minha pergunta se precisava de algo. Aconselhou-me à continuar ser o menino bom que era.

A outra da direita descreveu meu quarto de dormir e mandou que mudasse de cama, pois a que eu dormia estava me trazendo maus sonhos.

De fato, meu sono era muito agitado. Após sua recomendação passei a dormir melhor.

Uma experiência inusitada que carrego comigo. sem explicação!

Mais uma pergunta sem resposta que a vida me impôs,

24/04/2023

Pedro Parente




sexta-feira, 21 de abril de 2023

EFÉMERIDE

 EFÉMERIDE

Os anos passaram. Me aproximo dos oitenta e três anos em outubro, consequentemente a vida mudou.

Alguns tentam disfarçar tratando a velhice como “melhor idade”.

Triste engano! 

Nos resta apenas tristeza, desengano e a solidão é nossa companheira.

Quarta feira, recebi a visita de velhos amigos e quero registrar aquelas horas felizes que passamos juntos.

Cláudio e Regina; Francisco, Luiz e nosso menestrel Edmar trouxeram muitas alegrias ao meu cansado coração que insiste em me manter vivo.

Sob os acordes de melodias próprias do meu  repertório Cláudio e Edmar me fizeram viajar pelo passado,

Incrível!

Como velho boêmio que sou, não faltaram lágrimas de emoção, não de tristeza.

Voltaram na minha cabeça muitas lembranças de grandes momentos que vivi inclusive com o Aldo no Bar do Antônio José

Atualizamos nossas prosas sobre os tempos pretéritos e o assunto só amenidades,

Todos com um grande sentimento pela música que é a melhor maneira de se conversar, já dizia o poeta Chico Buarque a noite passou rapidamente num clima de confraternização e carinho.

Pena que nessas horas o ponteiro do relógio gira na velocidade de um ventilador.

Fim de noite, copos vazios e alma cheia.

Vi meus companheiros irem embora fiquei com a esperança de tê-los de volta para nova efeméride!

21/04/2023

Pedro Parente


PARAFUSO FROUXO

  PARAFUSO FROUXO

Numa prole de cinco irmãos, fui o último. Todos homens. Tempos felizes da infância saudável. 

Como não poderia deixar de ser, cinco meninos juntos as traquinices eram constantes. 

Quando minha mãe se encontrava com as “comadres sempre lhes perguntavam sobre o comportamento daquela pirralhada e ela respondia: 

- Um é um santo, dois são dois diabos! 

Para o mais endiabrado dizia que “tinha um parafuso frouxo”.

Assim fomos criados com esse linguajar coloquial sem preconceitos.

A mim parece que todos nós tínhamos um parafuso solto, tal as peraltices! 

Nesse caso, nossa casa era uma verdadeira oficina devido a grande quantidade de parafusos soltos.

O tempo passou! 

As regras de linguagem hoje são rígidas para alguns. Não podemos usar expressões do passado sob pena de sermos execrados.

Recentemente o Presidente Lula, referiu-se a pessoas portadoras de deformidade cerebral (não sei nem como digo são tantas exigências). 

Lula foi reprovado e achincalhado pela forma com que se referiu aqueles deficientes.

O Lula é Presidente do Brasil e não da Academia Brasileira de Letras. 

Pelo coração que tem, não quis ofender nem humilhar ninguém, pois é responsável pela Lei que dá direito à mãe de uma pessoa com deficiência, de ter certos privilégios na educação da criança.

Recentemente aquele que perdeu a eleição para Presidente do Brasil, deixou o cargo com a responsabilidade do assassinato de uma vereadora, mais de quatrocentas mil mortes por negligência na vacinação contra a pandemia e inúmeros outros crimes e no entanto é aplaudido por uma grande parte da sociedade fanática que apoia essa excrecência e outras mais. 

Exemplo: 

Vendeu a Refinaria Landulfo Alves na Bahia pela metade do preço e a diferença recebeu em propina, joias preciosas valiosíssimas.

Prefiro ficar com as atitudes do Lula em prol das crianças deficientes do que condenar seu palavrório.

Tem muito crédito!

21/04/2023

Pedro Parente


terça-feira, 11 de abril de 2023

BRASIL GIGANTE

 BRASIL GIGANTE! 

Anos setenta, fui visitar minha terra, a querida Belém.

Morando em Minas Gerais teria que percorrer 3.000 km. Escolhi o “caminho de dentro” como chamávamos a opção de sul a norte pela Brasília/Belém.

Viagem longa, porém, naquela época de “vacas gordas”, meu carro era um Ford – Landau cinza e teto vinil. Não lembro o ano, talvez 76, desta forma a viagem não se tornava cansativa, embora a monotonia das retas infindáveis daquela rodovia.

Após um mês em Belém, peguei um inverno tropical muito chuvoso, deu apenas para saborear a culinária deliciosa que me enchia a boca de água, porém a praia ficou sacrificada. Não que a chuva incomodasse, pois lá na linha do Equador até a chuva é morna.

Depois de me fartar de açaí, tacacá, tapiocas, pato no tucupi, ventrecha de filhote, cupuaçu, bacuri e outras delicias mais, decidi voltar pelo litoral. 

Peguei a Rodovia do Sol (BR 101) que vai do Maranhão ao RG do sul.

Ótima viagem de lindas paisagens. 

Eta! Brasil bonito!

Na medida que fui descendo nosso litoral, a paisagem foi modificando, deixando para trás aquele mundaréu de água por todos os lados, dando lugar para a seca causticante.

Quanto mais para o sul notava-se a seca mais severa. Até que cheguei ao sul da Bahia.

Ali meu coração apertou. 

Meninos espertos cobriam de terra os buracos no asfalto, que eram muitos, na expectativa de algumas moedas que os caminhoneiros jogavam generosamente em retribuição pelo seu trabalho.

Mais adiante, uma velhinha com uma garrafa vazia na mão.

- Moço não quero dinheiro quero água!

Atendi seu pedido e segui em frente envolto nas minhas reflexões.

Logo adiante, uma cena inesquecível. 

Um casal, parecia irmãos. Pequeninos, pés descalços, sem blusas apenas um calção roto e sujo. Manchados pela poeira e com os narizes escorrendo, marcavam suas faces com rastro das lágrimas escorridas de seus olhos tristes.

Voltei. Não me contive. Aquelas expressões atormentam meus pensamentos até hoje.

Entre lágrimas, dei-lhes meus refrigerantes e sanduiches que levava num isopor. 

Surpresos, não sabiam o que fazer. Saíram correndo pra dentro do mato ralo, talvez levando aqueles alimentos para os que ficaram em casa famintos sem saber o que fazer e sem ter para onde ir.

Este é o nosso Brasil gigante que leva em sua bandeira essa pecha da fome e da miséria de seus filhos que não pediram para nascer.

Um dia tudo acaba levando o sofrimento embora!

11/04/2023.

Pedro Parente



sexta-feira, 17 de março de 2023

TEMPOS FELIZES

 TEMPOS FELIZES

Vivíamos tempos felizes nos anos 60/70. Nossa cidade São João del-Rei era exaltada como o melhor carnaval do interior do Brasil, graças à genialidade do Jota D’Ângelo e sua esposa Maria Amélia. Ele, cientista, sambista, teatrólogo e outras qualidades que Deus lhe deu, criou uma escola de samba que era um verdadeiro luxo.

Durante o carnaval, a cidade ficava lotada, não só de turistas como também, de jornalistas e repórteres que aqui vinham para fazer a cobertura para seus periódicos.Com isso o nível do desfile das Escolas de Samba subiu para um patamar muito alto, pois despertou a disputa e outras escolas foram criadas.

Naquela época, tudo acontecia na “Esquina do Kibon” que recebeu esse apelido por ter sido ali instalado o primeiro freezer dessa marca já tradicional e quem atendia os fregueses era nosso saudoso Claudionor que depois montou seu barzinho mais pra frente servindo além de sorvete, um cafezinho e quitandas mineiras. Passou a vida de comerciante ali naquele quarteirão. 

Tinha uma freguesia tradicional composta, principalmente, por aqueles jovens de outrora, hoje encanecidos.

Era uma alegria só!

A turma era heterogênea! Uns com pouca e outros com muita idade. Não havia distinção. Só não havia lugar para os mau- humorados.

Haviam dois bares que faziam concorrência pacífica. Invariavelmente um proprietário visitava o estabelecimento do outro em admirável harmonia. A freguesia optava pela frequência de um dos dois, naturalmente.

O proprietário que mais durou foi o do Clever’s Bar. José Carlos pessoa atenciosa. Trabalhava muito. Tinha por ele uma admiração pessoal, pois quando comecei a frequentar seu bar, mesmo morando no Rio, permitia que “pendurasse” minha conta até minha volta.

Era costume, a turma mais velha, Arthur, Sô Lobo, Titita e outros, permanecerem ali bebendo até o Zé Carlos fechar. Naquela altura o Zé já participava das rodadas com seu famoso “rabo de galo” que consistia misturar várias bebidas de dose em um copo só e mandar pra dentro.

Com as portas de aço fechadas, a prosa continuava e o grau da “marvada” ia subindo. De repente, um circunstante perguntava quem morreu?

Os velórios eram feitos em casa. Normalmente serviam café com biscoito àqueles que iam prestar suas condolências ao “de cujos” e aos íntimos, lá no fundo da casa, uma pinga era certa.

Naquela noite, a turma se excedeu na prosa e quando deu pela coisa a madrugada já ia alta. 

Partiram todos para um velório no Tijuco.  

Um casarão lúgubre, pouco iluminado com um longo corredor. Tateando, cegaram até o morto estendido em um modesto caixão com quatro círios acesos em sua volta.

Titita sempre pensando em fazer “arte” obedecendo seu humor, postou-se na entrada da casa e todos os que chegavam ele avisava contrito, baixinho:

- CUIDADO COM O DEGRAU!

Os avisados percorriam o imenso corredor, arrastando os pés esperando topar com o tal “degrau” que não existia.

Uma boa maneira de encerrar uma madrugada boêmia!

17/03/2023

Pedro Parente

 


sexta-feira, 10 de março de 2023

CASAMENTO DO ARTHUR

 CASAMENTO DO ARTHUR

Vivíamos tempos felizes em João del-Rei e nos encontrávamos na esquina do Kibon. Era o ponto da muvuca. Todos gozando uns aos outros, sem confusão.

A turma era eclética e não havia distinção de gênero, nem de cor e muito menos de situação financeira. Os que tinham boa situação, pagavam para os que não tinham, semc fazer perguntas e sem humilhação.

Normalmente, quando estávamos com os bolsos recheados com o pagamento do mês e amigos endinheirados, por entre enormes 

queijos dependurados do teto, sentávamos na Cantina Calabresa, de uma simpática e laboriosa família italiana.

Já tínhamos nossa mesa reservada. A famosa “mesa zero” onde eram servidas as delícias daquela terra acompanhadas de bons vinhos Chianti.

Chamava-se mesa zero porque certo dia o Judas estava sentado em uma das mesas e eu na outra. Um de nós fez um pedido. Quando o Brás trouxe perguntou onde seria marcada a “comanda”?

Os números eram colados na parede em um pedaço de papel. Cada número em um papelzinho. No caso era mesa 10, porém o número um havia caído.

Judas, sem pestanejar mandou debitar na mesa ZERO, pois foi o número que sobrou.

Estava batizada a mesa “ZERO”.

Ali discutia-se tudo, desde politica e, principalmente samba. As vezes uns exaltados, depunham até presidente de países amigos!

Nesse clima, vivíamos a gargalhar, irresponsável e alegremente. Arthur com seus “causos” contribuía para o humor da mesa. 

O tempo inexorável foi passando até que certo dia Arthur conquistou uma namorada. Ela, também passou a ter seu lugar na nossa mesa. 

Com todo respeito!

Daquela convivência, surgiu a ideia de promovermos o casamento do Arthur.

O consultamos e ele gostou da ideia, pois não se conformava em morrer e deixar sua pensão do INSS para ninguém. Nesse caso ficaria para a viúva.

Sua aposentadoria foi conseguida à conselho de autoridades que nos premiavam com sua presença e a contribuição dos nossos parceiros de boemia.

Foi aberta uma poupança na Caixa em seu nome. Todos contribuintes tinham direito à festa no salão adjacente à Cantina.

Luiz e irmãs, filhos do seu Ítalo entraram com os pratos salgados. A bebida seria paga pelos consumidores.

Não assisti a cerimonia religiosa pois estava envolvido com a festa que foi um sucesso inesperado

Lotou o salão!

Dezenas de autoridades, comerciantes, industriais, juízes, generais e outros boêmios.

Festa de arromba!

O chope correu solto! Nenhuma confusão!

A poupança rendeu uma grana substancial. Anos passaram e ela ainda estava intacta. 

A quem pensava que ele era perdulário, enganou-se, era um tremendo “mão de vaca”.

O tempo passou, sem ter onde morar com sua esposa, recolhi o casal na minha casa.

No final de sua vida, internado em um hospital no Rio, já doente divertia todo mundo na enfermaria. 

Antes de morrer disse ao médico que o atendia:

- Dr na vida já fui tudo, menos puto e ladrão!

Saudades do bom amigo que a perversa morte levou!

10/03/2023

Pedro Parente






luis antonio

 


terça-feira, 7 de março de 2023

REGENERAÇÃO DE UM DEVASSO - Parte 2

 REGENERAÇÃO DE UM DEVASSO – Parte 2

Prosseguindo com a narrativa a respeito do filme 8mm produzido pelo Serginho Ratton para competir no Festival de Cinema de Curta Metragem no Rio de Janeiro e elenco amador da Esquina do Kibon, muita coisa aconteceu.

Encerrada a filmagens foram todos comemorar no boteco do Vandico na zona boemia próximo à casa da atriz principal. Ela era um monumento feito em mogno preto tal seu corpo esbelto e charme impecável. Preservo seu nome por motivo óbvio. O Arthur – ator principal não descolava dela embora seu coração já pertencesse a outro. 

Ninguém tinha ciúme! Eram todos amigos e pertenciam a mesma seita dos celibatários.

No final da comemoração com o dono do boteco já apreensivo, pois tinha perdido o controle da conta, começou a coçar a cabeça prevendo seu prejuízo. Serginho, o produtor, assumiu o comando e fez uma coleta com os que tinham algum trocado.

Deu tudo certo e o dono da botica ficou feliz.

Encerrada a filmagem coube ao produtor fazer os cortes e acabamentos e partir para o Rio, pois o prazo estava se esgotando para cumprir a parte burocrática.

Na noite marcada, seriam duas noites, no Cinema Paissandu no bairro do Flamengo às 20 horas foram exibidos os filmes concorrentes.

Arthur todo de branco, inclusive os sapatos, nada de terno, cabelo arrumado com brilhantina Glostora, recebendo na portaria os convidados, muitos da sua cidade, era o verdadeiro galã das chanchadas da Atlântica.

O Festival era sério. O júri era composto por figuras consagradas do cinema e do teatro, entre eles Alex Viani renomado e admirado por suas peças e seus livros sobre a sétima arte.

O filme foi muito aplaudido. Passou na primeira peneira e ficou para a segunda noite o julgamento final.

Não ganhou o primeiro lugar, mas foi bem classificado.

De volta à “terrinha”, o filme repercutiu nas redondezas.

O prefeito de Aiuruoca, convidou para que o filme fosse rodado naquela simpática cidade e que se levasse os atores.

Assim foi feito. 

Foram recebidos com banda de música e um lauto jantar.

Sobrou comida, porém o garrafão da “preciosa” teve que ser reabastecido.

Arthur, como sempre, com sua simpatia conquistou o coração das moças, inclusive o do prefeito que gostou tanto, não queria que ele voltasse.

Éramos felizes e sabíamos!

07/03/2023

Pedro Parente



segunda-feira, 6 de março de 2023

REGENERAÇÃO DE UM DEVASSO

 REGENERAÇÃO DE UM DEVASSO

Lá pelas décadas 50/60, “Anos Doirados” vivíamos a plenitude de nossa juventude. 

Na “Esquina do Kibon” era um clima de imensa alegria da turma que ali frequentava assiduamente.

Numa turma grande as habilidades de seus componentes são diversas. Sergio Ratton craque no manuseio de máquina fotográfica e filmadoras, projetou fazer um filme curta metragem, acho que se chamava 8mm, para concorrer num Festival no Rio de Janeiro.

Como não dispunha de orçamento generoso, convocou seu elenco de protagonistas entre os amigos participantes das mesas dos botecos da esquina. Para ator principal escalou Arthur Nogueira. Um figuraço! 

A mesa a que estivesse sentado, formava-se roda de boas risadas tal era seu senso de humor. Não havia ninguém que ficasse sério com suas histórias passadas no Rio onde foi aluno laureado na malandragem carioca.

No roteiro do filme, em certo pedaço, Arthur representava o demônio sentado ao lado do sino na torre da igreja Matriz. 

Para caracterizá-lo de diabo, teriam que ser adaptados os dois chifres. Devido os parcos recursos foram improvisadas duas casquinhas de sorvete. 

Podem não ter ficado muito perfeitas, mas que eram saborosas não tenho dúvida!

Um cenário que não poderia faltar era a zona do meretrício, extinta pela concorrência da liberação do sexo após o Festival de Woodstock - (droga, sexo e rock in roll).

A atriz principal fora encontrada naquela zona boemia. Uma linda boneca negra, jovem de corpo escultural. Arthur, fora de cena, não a deixava em paz!

Lembro-me de uma das últimas cenas, constava o enterro do “Devasso” que levava o Arthur dentro de um caixão de madeira. O cortejo foi um pouco demorado, pois em cada boteco no trajeto, uma parada para abastecer “a bateria”. 

E tome pinga!

Lá pras tantas, uma parada definitiva! Todos entraram no boteco e esqueceram o Arthur, dentro do caixão no sol pois já cochilava sob o efeito da “marvada pinga”.

Começou a amontoar-se a garotada curiosa em volta docaixão.

De repente, um milagre: o morto sentou-se no caixão e a garotada saiu em disparada.

Nosso herói entrou no boteco protestando onde a turma já curtia a terceira dose!

Os circunstantes não entenderam nada!

Vá de retro!

06/03/2023

Pedro Parente 


sexta-feira, 3 de março de 2023

SEQUELAS DA BOEMIA

 SEQUELAS DA BOEMIA

Há tempos, no Bar do Antônio José, nas noites de terças feira era dedicada à seresta no que o proprietário batizou de “Noite do Aldo.

Aldo Lobo Leite tinha um vozeirão de fazer inveja.  Se acompanhava com seu inseparável violão seresteiro. Como seu amigo de longas datas, me atrevia a participar com ele daqueles verdadeiros saraus.

Era uma temeridade, pois na madrugada, embriagado, assumia o volante do meu velho Gol 1.600 e atravessava a cidade para chegar à minha casa.

Tinha o cuidado de manter meu estado etílico controlado.

Certa noite, a seresta estava muito gostosa e o Aldo tinha hora para deitar-se. O Bar estava cheio alguém pediu que o substituísse. Um dos participantes pegou o violão e a emoção tomou conta de mim fazendo que perdesse a noção do tempo.

Alta madrugada o dono do Bar já querendo dormir pois o mesmo era em sua casa de moradia, paramos, pagamos a conta e saímos.

Aí percebi que tinha excedido na “marvada pinga”. Sentei-me ao volante do “pau velho” e não sabia se dormia ou dirigia. 

Com a imagem do meu filho na lembrança, dispus-me a chegar rápido em casa.

Próximo à minha casa no bairro retirado onde moro na zona rural, desceram na minha frente dois cavalos.

Consegui desviar, porém não desviei do barranco e entrei com tudo nele.

Bati com violência. Sem cinto de segurança não machuquei porque Deus não quis.

Passado um tempo, percebi que minha coordenação motora não estava bem. Tentava colocar a tampa numa garrafa, errava o gargalo.

Tive que levar minha família a B. Horizonte. No meio do caminho notei que estava “comendo a faixa” que divide as pistas.

Percebi o perigo e pedi que meu sobrinho nos trouxesse de volta.

Chegando em casa liguei para meu amigo Dr José Flávio e contei-lhe do meu sintoma. Pediu-me que fosse internado imediatamente na S. Casa. 

Após fazer ressonância na minha cabeça, constatou um sangramento que estava pressionando meu cérebro perigosamente.

No dia seguinte o Dr Paranhos abriu minha cabeça. A pressão era tão grande que o sangue coagulado saltou longe.

Felizmente correu tudo bem nas mãos desses profissionais de primeira categoria.

Quando voltei da anestesia e recobrei meus sentidos, o meu amigo Zé Flávio para verificar meu estado de consciência, falou:

- E aí Pedrão?

- Estive no inferno!

- Tinha mulher boa lá?

- Se tivesse eu tinha ficado por lá!

Aí ele pode confirmar o meu estado de lucidez!

Essa foi uma das minhas visitas a UTI da Santa Casa a quem devo agradecer a competência e generosidade de todos aqueles que ali militam.

Já era para eu estar do outro lado, porém o Zé Flávio e o Paranhos não deixam!

Obrigado!

03/03/2023

Pedro Parente


segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

CANOA A VELA

CANOA A VELA
Final da década de 50 com a energia dos meus dezessete anos, praticava o esporte de remo olímpico no Clube do Remo em Belém do Pará
O esporte exigia que as cinco da manhã os barcos e seus remadores estivessem, literalmente, dentro d’água, assim, imposto pelo horário, todos dormíamos na Sede Náutica.
Ali eram guardados os barcos, que após o uso eram colocados em seus cavaletes, por isso chamávamos de “garagem”.
Um primo de minha mãe, ex-remador, deixou ali guardado uma canoa a vela para ele passear aos domingos na baia de Guajará.
Na monotonia dos dias de semana, quando não tinha parceiro pra jogar sinuca, a cabeça ficava girando procurando uma arte ou uma aventura.
Assim é que chamei meu amigo Batalha, para dar “um bordo” na canoa do primo.
Colocamos a canoa n’agua instalamos a vela, o leme com o respectivo encordoamento e partimos.
Soprava um vento leste no través. Maré de meia enchente, parti no sentido contrário, pois se faltasse vento a correnteza nos traria de volta
A canoa de bom velame corria mansa sobre as pequenas ondas transportando dois marinheiros de primeira viagem. 
Estava me sentindo o machão, quando, de repente o vento mudou a intensidade que refletiu na vela e consequentemente no mastro. Nesse instante, um enorme estalo.
Meu sangue foi para os pés. Achava que ia soçobrar e o medo aumentou quando lembrei que meu amigo não sabia nadar. 
Imaginei que o mastro havia quebrado. 
Rezei para todos os santos!
Cheguei a pedir socorro para outra embarcação que passou por nós que nos respondeu com um aceno pensado que eu estava cumprimentando-os.
Quando a adrenalina baixou, percebi que o mastro estava inteiro. Deduzi que o estalo foi provocado pela acomodação da carlinga – peça onde o mastro se encaixa.
Passado o susto, cambei o bordo e ajudado pelo vento em popa, chegamos rapidamente ao Clube.
Como nada fica escondido, no domingo seguinte o dono da canoa queria saber quem havia mexido no seu barco.
Cara de paisagem e silêncio profundo foi a minha resposta.
Aff...
27/02/2023
Pedro Parente. 

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

IMPRUDÊNCIA

 IMPRUDÊNCIA


Após a construção de uma rotatória imprudente na avenida Luiz Giarola a transformando em obstáculo para motoristas conscientes,

O efeito foi contrário para aqueles que não temem por sua vida e põe em risco a vida alheia. 

Motos e carros transformam-se em verdadeiros bólidos. 

Numa dessas madrugadas um desses irresponsáveis, atropelou a rotatória e foi parar no outro lado com um carro de alto valor todo danificado, felizmente o anjo da guarda do audacioso piloto estava de plantão o protegendo da morte. 

Antes que seja tarde, a fim de proteger as famílias e os transeuntes que por aqui trafegam, alguns trabalhadores que usam bicicletas e outros desportistas, torna-se urgente a instalação de redutor de velocidade eletrônico, os “pardais” para conter o ímpeto desses inconsequentes.

Paralelo a esse perigo, agora uns motoqueiros resolveram empinar suas motos, na rua que dá acesso ao condomínio Capanas del Viento”.

Incrível a falta de respeito com os moradores daqui onde ates era um lugar calmo e bucólico.

A “força do progresso” derrubou uma floresta que está sendo substituída por mansões de concreto daqueles protegidos pela sorte.

Dizia Nelson Gonçalves em uma de suas belas canções:

“O que fazer?

Não pode haver retrocesso

Ante a força do progresso

Meu violão silencia.”

20/02/2023

Pedro Parente


segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

PORTA AVIÕES SÃO PAULO

PORTA AVIÕES SÃO PAULO.
As Forças Armadas são generosas em suas compras. Além de comprarem uísque, leite condensado, Viagra, prótese peniana que nos leva a pensar nos quartéis e bases, como verdadeiros prostíbulos. 
Não dá para empenhar o serviço das moças que ganham a vida vendendo o corpo, porque não emitem Nota Fiscal. Nesse caso são feitos malabarismos e o cartão corporativo paga.
Quão generoso é o gerente do cofre de plantão.
Recentemente uma dessas compras desastrosas o Porta-avião São Paulo, nau capitânia da gloriosa esquadra da Marinha do Brasil por absoluto obsoletismo, foi sepultado no fundo do Atlântico após navegar puxado por um potente rebocador, sendo rejeitado por vários países.
Seu destino seria o Líbano ou a Síria que o adquiriu como sucata para indústria siderúrgica daquele país. Por se tratar de um equipamento muito antigo, foram empregados em sua construção, diversos materiais altamente poluentes como amianto, chumbo, mercúrio e outros mais.
Não entendo por que compramos esse tipo de navio de guerra!
No caso do S. Paulo, já havia servido à Marinha francesa durante quarenta anos. Quer dizer, chegou aqui ultrapassado. Não sei de nenhuma missão que haja participado, se o fez, foi somente para aumentar o prejuízo, pois sua tripulação era em torno de 1.300 homens e algumas toneladas de combustíveis.
Ficou atracado ao cais da Ilha das Cobras no Rio de Janeiro e nunca o vi em movimento.
Os franceses morreram de rir. Resolveram um problema onde depositar aquela sucata e ainda levaram um bom dinheiro do povo brasileiro.
A outra nave desse tipo, me parece que teve o mesmo destino e a mesma inutilidade.
Acho que foi comprado na época do JK.
Naquela época tínhamos nosso “menestrel” Juca Chaves. Compositor excêntrico, muito inteligente, tocava um alaúde e só andava descalço. Manifestou-se compondo uma melodia que dizia assim:
“Brasil já vai a guerra
Comprou porta-aviões
Palminhas pra Inglaterra
Oitenta e dois milhões.
Mas que ladrões!
Porém tem uma peninha
É meu diz a Marinha
É meu diz Aviação.
Que confusão”
A Marinha queria colocar seus pilotos e a Aeronáutica bateu os pés e não aceitou.
Agora a solução foi encontrada, afundaram o S. Paulo no mar, em águas brasileiras, transformando o oceano num enorme lixão.
Brilhante a cabeça responsável!
Vida que segue!
21/02/2023
Pedro Parente