sexta-feira, 20 de novembro de 2020

DE VOLTA A SAQUAREMA

 DE VOLTA À SAQUAREMA

Semana Santa chegando, nos reunimos no Garden Bar para mais uma noitada e combinarmos eu, Estradinha e Nerthan nossa volta à Saquarema.
O carnaval tinha deixado boas lembranças e saudades daquela gente humilde e acolhedora daquele local.
Desta vez tomamos o cuidado de comprar as passagens com antecedência. Mordomia, o ônibus nos deixou na porta da casa do pai do Estradinha a quem já chamava de “Seu Rodovia”.
Era uma figura admirável! Morava sozinho. Destemido, desses que não tem a palavra medo no seu dicionário. Bom contador de “causos”.
Disse que certa madrugada, estava deitado, percebeu um vulto sentar-se em sua cama. No escuro, do jeito que estava, de lado, com o travesseiro debaixo da cabeça, falou:
- “Se for mulher pode ficar!”
Sentiu o colchão voltar ao normal e foi-se embora, chegando a conclusão que o fantasma era homem e obediente.
Conhaque debaixo braço, dessa vez Nerthan levou estoque do seu Melnhaque, rumo à birosca na praia.
Agulha e Sabará já estavam lá, como sempre. Uma festa só! Muitos abraços, declarações, peixe frito e cachaça.
Uma novidade na praia. Um rapaz improvisou e fez de um paraquedas a cobertura do seu bar na areia. Fui lá visita-lo.
De repente uma correria e gritos vindos da beira da praia. Uma moça estava se afogando, puxada por forte correnteza no final da enseada.
Faz parte da minha personalidade não conviver com covardia e situações semelhantes. Não tinha ninguém ali que pudesse ajuda-la. Fatalmente morreria.
Corri em seu socorro. Levei comigo um pedaço de isopor, resto de uma prancha.
Entrei na “boca” o nome que dão à correnteza. Rapidamente cheguei até ela, dei-lhe o pedaço de isopor, aumentando assim sua flutuabilidade e acalmei-a:
- Sou o salva-vidas da área!
Tomei o cuidado de pegar seu braço pelas costas junto as axilas, evitando que ela, em desespero me agarrasse e fossemos os dois para o fundo. Nadei em diagonal a correnteza e sai da “boca”. Como o mar não estava feroz, pudemos chegar à praia numa boa.
Fui ovacionado!
Haha! Tive meu dia de glória! (cabotinismo).
O bom é que a mãe da moça em retribuição deixou umas cervejas pagas. Não iria fazer desfeita, porém como não sou cervejeiro, chamei a turma da birosca e dividi com ela o prêmio.
Mais um dia de alegria em Saquarema!
20/11/20
Pedro Parente

MISSISSIPI EM CHAMAS

 Em 1988 Assisti um filme com Gene Hackman e chamava-se Mississipi em Chamas.

Saí do cinema revoltado de tanta covardia praticada pelos estadunidenses contra os negros.
Pensei que felizmente no Brasil há respeito entre as diferentes raças que promovem nossa miscigenação.
Me parece que o único lugar do mundo que árabes e judeus convivem em harmonia é na rua da Alfândega no Rio de Janeiro onde o comércio dos rivais os aproxima.
Brutal engano! Infelizmente!
A população negra está sendo massacrada pela polícia que deveria protegê-los.
Importamos do hemisfério norte o que há de pior. A discriminação racial.
Lá eles são apenas 12% da população, ao contrário do Brasil que é mais de 50%.
Aqui não é lugar de KuKluxKan assassina.
É uma aberração vista em nenhum lugar do mundo, policial negro matando seu irmão de cor sem ter cometido crime!
A justiça não pode perdoar esse tipo de gente.
Essa sociedade vil e calhorda tem que reagir. Ao invés de ficar lotando templos pedindo a Deus em seu favor e enchendo os bolsos dos vendilhões da cruz, reajam e ajudem os menos protegidos pela sorte.
20/11/20
Pedro Parente

ADEUS BELÉM DO PARÁ

 ADEUS BELÉM DO PARÁ.

Minha guarnição de remadores, quatro com patrão, disputou a eliminatória para o Campeonato Brasileiro de Remo de 1960 na Lagoa Rodrigo de Freitas no Rio de janeiro pelo Estado do Pará e venceu.

Esporte amador sobrevive com muita dificuldade muitas vezes com doações generosas de aficionados. 

No nosso caso o avião que nos transportou para o Rio era um bimotor Beechcraft de 7 lugares, sendo 2 lugares ocupados pelos pilotos, coronéis da FAB que faziam horas de voos. Pousava com uma rodinha traseira e os trens tradicionais sob as asas. Sua autonomia de voo era pequena não lhe permitia percorrer grandes distâncias. Qualquer campo de futebol para peladas que via, descia.

Éramos jovens e nunca extrapolado as fronteiras de nosso Estado, por tanto sem nenhuma experiência. 

O novo assusta! 

A expectativa nos deixou agitados, intrigados e principalmente apreensivos em deixar nossas famílias pra trás.

Nos preparávamos para dormir na sede náutica do Clube do Remo, quando o telefone tocou e comunicou que havia um avião para transportar 5 atletas por ordem da CBD Confederação Brasileira de Desportos rumo ao Rio de Janeiro. A partida seria às 5 horas da manhã da Base Aérea de Val-de-Cães.

Muito triste quando comuniquei a minha mãe que iria para o Rio. Coração de mãe não se engana. Implorou ao meu pai que não me deixasse ir. Meu pai austero lhe falou: 

- Ele venceu tem que ir!

Ela previu naquele momento que eu não voltaria! Era um adeus!

Às cinco da manhã conforme combinado, chegamos à Base e embarcamos na aeronave com muita dificuldade. Espaço exíguo. Apenas 5 poltronas individuais.

Poucas horas no ar e aterrissamos numa clareira para reabastecer.

A comitiva de recepção era de índios portando arco e flecha, alguns trazendo galinhas tentando arrecadar algum dinheiro. Uma pobreza de dar dó.

O Comandante nos preveniu que eram inofensivos.

A parada foi efêmera. Não deu negócio entre nós, pois não tínhamos nada para trocar e muito menos dinheiro para comprar as bugigangas deles. Mesmo decepcionados não pouparam seus acenos quando o avião decolou.

Subimos e descemos várias vezes até pousarmos em uma pista secundária, no aeroporto do Galeão às 17,30 h. 12 horas de viagem e se o veto tivesse soprando contra, acho que ainda estaríamos voando até hoje,

A pista era ladeada de capim alto dando impressão de desleixo. 

Pensei: 

- Isso que é o Rio? Um matagal danado!

Fiquei decepcionado.

Pegamos um táxi e o companheiro informou o endereço, Hotel Ipanema no Leblon.

Mal sabia que ali estava escrito meu destino, pois levava comigo o endereço de minha tia Ataulfo de Paiva 50 B2 ap.904

Quando o taxi entrou em Copacabana já com os neons acesos, meu queixo caiu. Fiquei extasiado e lá por dentro senti que não voltaria mais para minha terra. Tinha apenas 19 anos. O Rio era o sonho dourado de todos.

No hotel, de curiosidade, perguntei onde era aquele endereço que eu levava no bolso?

O dono do hotel Sr. Jesus, espanhol fumante de cachimbo, mostrou-me o Edifício dos Jornalistas exatamente do outro lado da rua. Foi só atravessar.

Passei 15 dias no hotel até o final da competição de remo. Conseguimos um honroso quarto lugar no nosso páreo.

Nossas condições esportivas eram muito adversas. Além do Sudeste ser mais desenvolvido e consequentemente seus remadores mais bem treinados, lá remávamos em água doce e corrente, na Lagoa a água é parada e salgada. Faz uma diferença brutal no peso das pás dos remos. Nosso ritmo de remadas completamente diferente. Enfim, entre dez competidores nos saímos bem.

Fiquei um tempo morando na sede náutica do Vasco e depois atendi o pedido de minha tia e fui lhe fazer companhia no Edifício dos Jornalistas.

Foi o que de melhor aconteceu. Pude viver os melhores anos da minha vida junto com aquela turma maravilhosa do hoje lendário prédio do Leblon.

Essas lembranças perdurarão indeléveis em meu coração até a morada final.

20/11/20

Pedro Parente








quarta-feira, 18 de novembro de 2020

SAQUAREMA

 SAQUAREMA

Num carnaval nos anos 60, meu amigo Alfredo, o Estradinha, vizinho no Bloco B2 do Edifício dos Jornalistas no Leblon, entre um chope e outro no Garden Bar, convidou-me para visitarmos seu pai morador em Saquarema no Estado do Rio.

Chamei Nerthan e fomos os três para a Rodoviária. Sábado, não tinha mais passagem para Saquarema e tomamos o ônibus de Bacaxá cidade vizinha há alguns quilômetros.

Chegamos no ponto final, descemos e empreendemos nossa caminhada, não sem antes comprar uma garrafa de conhaque Palinha. Nerthan não encontrou o seu preferido Melnhaque. 

Sol a pino conseguimos chegar com o conhaque saindo pelos poros encharcados de suor.

Estrada nos apresentou seu pai. Diferente dele, alto, forte de chapelão, exercia uma função pública no município, acho que escrivão juramentado.

Morava sozinho e nos recebeu com muito carinho e educação Sua casinha era muito aconchegante, de duas águas, muito comum na roça.

Saquarema era uma colônia de pescadores cativante. Não possuía nada de moderno. Cheiro de mar misturado com mato formavam uma essência comum em frascos franceses. 

Inebriante!

Demora pouca. Rumo ao boteco.

Na praia tinha uma birosca na ponta da enseada de pedra onde existia uma casa cuja piscina era alimentada pela água do mar na maré alta. Nunca imaginei.

Internamos ali na birosca e Nerthan com seu violão atraiu a maioria dos pescadores que estavam nas adjacências. Em pouco tempo havíamos amealhado muitos amigos. Ótimos todos simples e solidários. Não sabiam que fazer para nos agradar. Entre eles lembro-me bem do Agulha e do Sabará. Adoravam seresta. A noite foi passando e se tornou amanhecer.

Deitamos numa canoa que estava puxada na praia e dormimos o sono dos justos até que o sol nos acordasse.

O pior de tudo é equacionar a volta para casa, cheio de ressaca e saudade daquele momento.

Nos comprometemos a voltar! E voltamos!

18/11/2020

Pedro Parente


 


domingo, 15 de novembro de 2020

NERTHAN

 NERTHAN

Na minha passagem pelo Rio de Janeiro na década de 60, morei no lendário Edifício dos Jornalistas no Leblon.

Foram anos felizes que usufrui da amizade de grandes pessoas, dentre elas o Nerthan que não era morador de lá, porém visitava sempre seu irmão que ocupava um apartamento no décimo andar do Bloco B1.

Paraibano dos bons! Destemido, brabo, forte, não aturava desaforo, por menor que fosse, mas tinha um coração gigante.

Num sábado pela manhã, o vento sudoeste soprou feroz e impediu nosso vôlei, como praxe, desci e já me entoquei no botequim do seu Antônio e dona Maria. Uma cerveja, pois não vendia chope, pinga e um pernilzinho fresquinho para abrir os “trabalhos”.

O boêmio é especial, mesmo sem GPS sabe exatamente onde encontrar guarida para seus encantos e desencantos. 

O bar é o lugar exato.

Eis que entra Nerthan já com os olhos cheios d’água. Me deu um abraço sentido e pediu uma dose de Melnhaque, conhaque com mel. Acho que era o único consumidor daquela mistura. 

Surpreso, perguntei-lhe do acontecido e ele me relatou, com seu sotaque carregado.

- “Pedinho, separei da mulher! Lhe disse que na minha casa só admitia mulher apaixonada por mim. Como prova do meu amor, deixo aqui na sala, aquilo que mais amo depois de você, meu violão!”

Jogou o conhaque na garganta, pegou o violão da casa, que dedilhava com carinho e começou a “Missa de Réquiem”. Cada canção mais triste que a outra. Acho que o conhaque saiu todo pelo canal lacrimal. Chorava lágrimas de esguicho!

Aos poucos o boteco foi enchendo entre os circunstantes o irmão dele Thompson.

Lá para as tantas seu Antônio precisava fechar o bar. Pagamos a conta e fomos fazer seresta nos bancos de cimento em frente ao B1. 

Thompson gritou para Deusa sua esposa:

- Mande duas cervejas e uns copos!

Lá veio a moça secretária de serviços gerais trazendo o pedido que seria repetido até o dia amanhecer.

O surpreendente é que não houve nenhuma reclamação dos vizinhos, sinal de que acalentamos o sono de muita gente.

Como ninguém é de ferro, um bom banho, uma soneca e de volta ao boteco. Seu Antônio ficava feliz!

15/11/20

Pedro Parente.

 

 


terça-feira, 10 de novembro de 2020

SILENCE

 SILENCE

Quando cheguei ao Rio, após disputar um Campeonato de Remo, resolvi ficar.

Minha bagagem era pouca, duas mudas de roupa, o terno do meu pai e o sapato de uso, tudo transportado numa sacola de alças com uma delas arrebentada. 

O problema era achar emprego. Sem formação acadêmica ou profissional, teria que entrar no mercado de trabalho pegando o que aparecesse.

Assim foi que, por intermédio de um parente da minha mãe consegui lugar em um escritório onde o rapaz que fazia o serviço morreu de repente.

Ali reuniam-se os proprietários e diretores das empresas distribuidoras de gás de botijão. 

Só milionários! 

Nos dias de reunião, sentavam-se em volta de uma enorme mesa e discutiam os problemas afetos aos derivados de petróleo.

Éramos apenas dois funcionários, Dª Iracema que conduzia a reunião, redigia a ata e eu que servia o cafezinho. 

Numa bandeja de prata com bule e xícaras de porcelana, para mim era uma grande responsabilidade. Trêmulo, pensava: 

- Se derramar café no terno de um desses homens terei de trabalhar de graça a vida inteira para pagar o desastre.

Morava no Edifício dos Jornalistas no Leblon. Quase todas as manhãs quando saia para o trabalho, encontrava no elevador com um senhor miudinho muito bem arrumado de terno impecável com um sorriso cativante, sempre me cumprimentava cordialmente.

Com meus, botões ficava lisonjeado pelo tratamento a mim dispensado. Passei a admirá-lo com muito respeito.

Certo dia nosso escritório iria promover um evento e por uma questão de civilidade e boa vizinhança decidiram convidar os vizinhos de andar. O incumbido de entregar os convites formais fui eu. O último a ser entregue seria para a representação da revista Time/Life.

Fui recebido por uma moça de traje azul marinho e salto alto que me adentrou ao recinto.

O convite era direcionado ao superintendente.

Fiquei acanhado de ver quanto luxo. Havia um pequeno mezanino com duas escadas laterais em curva, corrimãos de madeira e uma imensa escrivaninha. Do teto pendurada por duas correntes de metal, uma placa escrita em inglês SILENCE.

Subi a escada temeroso. Ao chegar no nível do assoalho pude ver sentado quase sumindo no comando daquele tanto de gente, o senhor que descia comigo diariamente no elevador.

Levantou-se gentilmente com seu sorriso e simpatia habituais, mandou servir um cafezinho.

Sai encantado!

Naquela hora, tornei-me mais amigo do admirável Jayme Dantas, uma personalidade moradora do hoje lendário Edifício dos Jornalistas.

10/11/2020

Pedro Parente


segunda-feira, 9 de novembro de 2020

SÉRGIO VELHO

 SÉRGIO VELHO

A turma do Edifício dos Jornalistas no Jardim de Alah no Leblon, era muito grande, pois o conjunto de seis prédios de 16 andares abrigava 420 apartamentos, segundo nosso amigo Paulo Issa.

Além dos moradores haviam muitos agregados que se tornavam membros da patota. Moradores de outros prédios e casas adjacentes, conviviam conosco na maior harmonia. 

Um desses chamava-se Sérgio Sparnazi (?). Morava no redondo da rua Gal. San Martin. 

Pessoa muito reservada e de humor variável. Metia a mão no bolso parcimoniosamente. 

Jogava vôlei na nossa rede na praia, porém se alguém passasse uma bola errada para ele, se transformava! Aquele cara discreto de pouco falar, se transformava. Tirava o chapéu de marujo que usava, fornecido pelo “Turquinho”, jogava no chão sapateava em cima ao som de sonoros palavrões que chamava atenção até de quem caminhava pela calçada.

Por causa das suas idiossincrasias, transformou-se em “Sérgio-Velho”.

Era frequentador assíduo do Jockey, principalmente se tivesse uma “barbada” que era fornecida por gente lá de dentro, diziam “barbada de cocheira”.

Aconteceu, naquela época, foram morar no B2 dois jóqueis que montavam cavalos de ponta nas corridas. A turminha chagada nas patas dos cavalos, tratou de fazer amizade com eles. Se não me engano eram A. Barroso e J. Souza.

Numa reunião noturna, me parece da quinta feira, um dos jóqueis deu uma “barbada imperdível” para o Sérgio.

Naquele dia ele tornou-se perdulário, enfiou a mão no bolso e apostou alto.

Chegou a hora do páreo e o Sérgio aflito com seu guarda-chuva, olhando de soslaio para aquele bando de otário que não tinha a dica que o deixaria folgado por um tempo, sentou-se na arquibancada meio retirado, ao seu estilo e o locutor oficial mandou lá no microfone:

- Partida boa para o quinto páreo! Largaram todos!

O Sérgio pensou: 

- Graças a Deus o meu também largou!

O locutor continuou:

- Assume a ponta Gualixo e vai deixando dois corpos de vantagem para o segundo lugar!

O Sergio não acreditava, vermelho quase tendo um troço. Andando dum lado ao outro.

- Contornam a turma de chegada, Gualixo não perde mais!

Sérgio já comemorava. Deixou seu jeito reservado de lado, fez o guarda chuva de estandarte e sambou como mestre-sala.

Eis, porém, que de repente o cavalo caiu morto, fulminado, pois tinha sido dopado até os miolos. 

Num gesto de desespero, estraçalhou o guarda-chuva contra a arquibancada, sentou-se com a cabeça entre as mãos, chorando soluçando, balbuciava:

- Só comigo! Só acontece comigo!

09/11/2020

Pedro Parente.



NB – O nome do cavalo é fictício.


O ESTRADINHA

 O ESTRADINHA

Segundo nosso amigo Paulo Issa, o conjunto de prédios que compõe o Edifício dos Jornalistas no Leblon, precisamente no Jardim de Alah, na confluência dos bairros de Ipanema e Leblon no Rio de Janeiro, possui 420 apartamentos.

Se considerarmos que em cada apartamento morava pelo menos um jovem adolescente, há de se imaginar o tamanho da nossa turma na década de 60. Os prédios foram construídos em 1956 e eu tive a felicidade de morar ali durante 10 anos. 

A densidade demográfica de gente boa que ali habitava, dava banho em Bangladesh. Era uma aldeia romântica e feliz!

As histórias são muitas, algumas muito interessantes com personagens sui generis e seus hábitos de vida.

No Boco em que eu morava, B2 lá para o 14º andar vivia um grande amigo que se chamava Alfredo Cardoso, contador do Banco de Crédito Real, na esquina da Bartolomeu Mitre com Ataulfo de Paiva na Pça Antero de Quental.

Estatura baixa, pernas arqueadas, era um terror no futebol de areia. Na ponta direita ninguém o marcava tal a sua velocidade. 

Imediatamente colocaram-lhe o apelido de “Estrada de Ferro” em alusão aos micro ônibus da época chamados de lotações, pois não transportavam passageiros em pé e faziam a linha Estrada de Ferro/Leblon. Eram reconhecidos pela velocidade que andavam. Muitas pessoas deixavam de usá-lo de medo.

De “Estrada de Ferro” como é habito do carioca abreviar os nomes, passou a ser tratado apenas como “Estradinha”.

Ali no B2 tinha uma senhora de cabelos brancos que deixava as panelas queimarem no fogão, para vigiar quem entrava e saia no prédio. Ficava o tempo que podia na portaria vigiando algum destemido que ousasse entrar com uma companheira estranha com propósitos “indecentes”.

O Estradinha tinha um apetite sexual de dar inveja em coelhos.

A noite, ele já tinha sua turminha de doméstica que após a lida diária desciam de banho tomado e perfumadas. Todas as noites elas iam ao seu encontro e não negava fogo, subia com uma, mais tarde outra e assim ia. Nunca vi igual.

Numa dessas noites no plantão daquela senhora moralista, quando o Estradinha se aprontava para subir com a segunda namorada, foi barrado.

- Isto aqui é um prédio familiar, não um prostíbulo!

- Desculpe, minha senhora, sou solteiro e o apartamento é de minha propriedade. Se tiver paciência a senhora pode ser a próxima!

Daquela noite em diante acabou-se a fiscalização voluntária daquela senhora.

09/11/2020

Pedro Parente