sexta-feira, 30 de julho de 2010

MOMENTO

O tempo passou.

Estou velho. As marcas são visíveis no meu corpo deformado.

Caminho com dificuldade com os joelhos castigados pelo desgaste dos anos vividos intensamente quando eles me acompanhavam na prática de esportes, de trabalho exaustivo a entregar correspondências no Rio de Janeiro quando iniciei minha vida naquela linda cidade.

Acompanharam-me também, quando dançava embalado por músicas e orquestras maravilhosas daquela época quando ainda se bailava abraçado e sentia-se o calor do rosto da moça chegando aos poucos até encostar-se à face do parceiro.

Um momento indescritível.

Lúdico.

Pura magia e sedução. Seria impossível não se emocionar.

Levitava-se.

Ser velho é natural. Quem não envelhece morre precocemente.

Então não temos opção.

Aquele que morre cedo, muitas vezes se livra da expectativa da morte. Deixa só saudade para os que ficam. Estes sim vão arrastando a lembrança pela vida a fora.

A mim restam poucas coisas e quando se tem poucas coisas, elas passam a ter muito valor por serem raras.

As lembranças da infância feliz. O carinho dos filhos e principalmente o ombro dos amigos com quem compartilho minhas alegrias, não os deixando perceber minhas tristezas.

Para os amigos quero tudo que há de melhor. Sem amigos eu não sobreviria.

Os melhores momentos do dia são aqueles quando eu os encontro no final da tarde para usufruir dos seus sorrisos sentados à mesa de um modesto botequim na periferia da cidade.

Com os humildes, trabalhadores, operários, advogados, marujos, boêmios é que me identifico onde ganho coragem para recomeçar a rotina do dia seguinte.

Chega sempre alguém para avisar que mais um companheiro foi embora. Deixou-nos. Mais uma saudade. Mais uma chaga aberta no meu velho coração cansado.

Os olhos opacos, sem viço, já não divisam pessoas que passam do outro lado da rua.

É comum confundir uns com outros.

Isso é ser velho.

Saber aceitar sua condição social.

Usar do privilégio de entrar na frente dos mais novos nas filas, não pagar condução e muitas vezes ser incompreendido por alguns.

Esses pequenos privilégios me nego a aceitar pelo respeito aos mais novos e para não me sentir mal visto pelo proprietário do coletivo.

Vou seguindo meus passos nesse caminho sem volta, rumo ao cadafalso.

Um dia tudo terminará.

Deixarei como herança alguns escassos dotes morais para meus filhos.

Levarei a saudade dos amigos.

A esperança é de que os encontre no além numa grande mesa de uma imensa festa. Rever todos aqueles que partiram. Abraçar um por um. Repousar a cabeça no colo macio da minha velha mãe, acariciá-la e dizer-lhe mais uma vez quanto a amo e das tristezas dos dias sem ela. Chorar de alegria de rever meu pai amigo e companheiro que me ensinou a trilhar pelos caminhos tortuosos da vida.

Vou seguindo em frente, amando a vida e temendo a morte.

Pedro Parente

pedroparentester@gmail.com

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