O CALVÁRIO
Naqueles
tempos, havia um caminhão velho bastante maltratado que já não possuía as
laterais e nem a parte traseira da carroceria.
O
capô não tinha mais as presilhas de maneira que quando passava em cima de um
buraco abria e batia com força como a boca de um jacaré. Por ter sido de cor
verde ganhou o apelido. Movido a gasolina, pouco circulava.
Era
dirigido pelo Ivo. Um moreno bem educado e solícito. A todos cumprimentava com
gentileza e por isso gozava de grande simpatia.
Certo
dia, Tião do Virgílio, homem forte, truculento e de pouco sorriso. Trabalhador
da construção civil. Num dia de sábado quando o serviço acaba mais cedo, ao
meio dia, catou uns restos de madeira ainda com restos de cimento que serviram
para a escora de laje. Fez um feixe, amarrou com arame cozido, forrou com a
camisa e “ombrou o bruto”.
Fazia
sol de rachar naquele dia de verão e sua casa estava muito longe, no alto do
Morro da Forca. Subida forte. Pensou: - Preciso desta lenha para fazer o
almoço. E começou a subir.
Trincando
os dentes de raiva pelo destino que a vida lhe reservara, a cada passo um
impropério.
Parou
no Tonico Verdureiro e tomou uma lapada da “marvada”.
-
Agora falta pouco!
Com
os passos cada vez mais lentos, estimulado apenas pela pinga, continuou
subindo.
Ao
dobrar na parte mais íngreme da sua rua, já avistando a soleira da porta da sua
casa, chega o Ivo em seu velho caminhão, solícito como sempre, segurou na
embreagem e insistiu com o Tião:
-
Joga a lenha aí atrás e entra!
Tião
relutou o que pode. Para não fazer desfeita com uma pessoa tão boa, aquiesceu.
Jogou o feixe de lenha no taipar e entrou na boleia sem porta.
Para
azar dele, quando o Ivo tentou arrancar com o caminhão, o motor apagou.
-
Não se preocupe! Galho fraco! Estamos na descida. É só um tranco e ele pega.
Disse o Ivo.
De
tranco em tranco o caminhão foi descendo, descendo até estacionar com o
restinho do embalo, na frente da construção que o Tião trabalhava.
Ivo
foi pedir desculpas.
Com
tanta raiva Tião pegou o feixe de lenha atirou no chão despedaçando os sarrafos
de tábuas para todos os lados.
Catou
tudo novamente, amarrou o feixe e recomeçou lentamente o seu calvário.
Dizem
que o caminhão ficou mais de uma semana parado ali até que o Ivo arranjasse um
trocado para abastecer.
Vida
ingrata!
09/07/2018
Pedro
Parente
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