domingo, 14 de fevereiro de 2010

TRISTESSE

Tristesse

(Estudo nº 3) op. 10    F. Chopin

Numa certa tarde plúmbea de S.João del-Rei, há muitos anos passados, quando desci do apartamento onde morava em cima do Restaurante Benegas, ali nas proximidades do antigo Banco de Crédito Real, fui presenteado com a delicadeza de acordes primorosos de um piano bem tocado, reproduzido por um aparelho de som de primeira qualidade.
Fiquei extasiado.
E como não podia ser diferente, movido pela curiosidade, como se levitasse, cheguei até a loja “O Palácio da Música”.
Não resisti, entrei e deparei com uma loja muito bem equipada de aparelhos de som da mais alta qualidade. Segundo meu amigo Camilo, um sonho de consumo para nós míseros mortais que circulamos pelo universo dos assalariados.
Fui recebido pelas simpáticas e eficientes recepcionistas da loja que imediatamente me apresentaram o proprietário, hoje meu dileto amigo Sílvio Assis.
Sílvio, uma pessoa que conhecia profundamente o produto com o qual trabalhava e possui a sensibilidade de descobrir o que o cliente gosta, deixava a todos satisfeitos.
Tornei-me seu amigo e frequentador assíduo daquele lugar. Qualquer cidade se envaideceria de possuir uma loja daquele gabarito, e eu estava vindo do Rio de Janeiro, a Meca da música, com centenas de lojas tradicionais, tais como a “Guitarra de Prata” na Rua da Carioca.
Sua discoteca era uma das mais famosas de Minas e do Brasil. 
Lá dávamos  ao luxo de conversar com o célebre maestro Waldir Silva, à época vendedor de discos da gravadora Odeon, se não me falha a memória.
Daquela época em diante, era difícil a vez que ali entrava e saísse apenas com um LP.
Sílvio como profundo conhecedor, sempre tinha a melhor oferta para cada gosto.
Lá, comprei uma “joia musical” do Pixinguinha, que meu amigo Cezar Faria - pai do Paulinho da Viola - autografou e guardo como um tesouro.
Assim foi que fui construindo minha pequena discoteca. O melhor disco que possuo, para meus ouvidos, foi sugestão do Sílvio. Conhecedor do meu gosto por árias clássicas, apresentou-me Operas do maestro Waldo de los Rios considerado “maldito” pelos maestros eruditos por acrescentar instrumentos musicais à sua orquestra, que não constam das orquestras tradicionais e modificar o andamento da música clássica, para musica “pop”.
Assim é que até hoje quando quero chorar de emoção, sim porque chora-se pelos mais diversos motivos, tristeza, desilusão, raiva etc... e no meu caso por pura emoção; coloco meu velho vinil na “vitrola” - hoje aparelho de som - e ouço a execução da ária da ópera Nabucco: Va... pensiero [Coro de esclavos] de Verdi.
Porém, na vida nada é definitivo e o progresso, avassalador nos transforma em pessoas saudosistas e melancólicas.
Não existe mais o Palácio da Música. Em seu lugar uma loja reluzente de telefonia celular, que à minha época, soava como ficção científica.
Ai de nós se não fosse Dª Mazinha da Cia Telefônica Sanjoanense que com carinho e dedicação na sua mesa telefônica colocava as pessoas em contato umas com as outras e São João del-Rei, com o mundo.
Recentemente, passando pelos “Quatro Cantos”, novamente, de longe, ouvi um som semelhante àquele que ouvira anos atrás na avenida.
Não podia ser diferente. Vinha da Casa Assis do nosso inestimável Jofre falecido recentemente e que era irmão do Silvio.
Não resisti entrei, fui recebido por uma de suas tradicionais atendentes que me indicou o Silvio.
Ali sentado ao balcão com seu jeitinho peculiar, selecionando as músicas para o deleite dos transeuntes.
Perguntei-lhe pela majestosa discoteca do Palácio da Música. Apresentou-me o pouco que resta, apenas uns cinco mil discos sendo vendidos a preço de feira. Disse-me:
- Aproveita que semana que vem vou fechar.
Saí as pressas para não deixar transparecer minha desilusão.
Em casa, envolto nas minhas recordações, coloquei na minha “vitrola” numa execução sublime de Pedrinho Mattar a valsa Tristesse de F. Chopin, belo fundo musical para um epílogo melancólico de uma fase esplendorosa da minha vida e da minha cidade querida.

14/02/2010
Pedro Parente.

3 comentários:

KK Freitas disse...

Também um filme rodou em minha cabeça ao ler sobre o Palácio da Música. Boas lembranças que só um bom vinil pode proporcionar! Obrigada pela visita em 'Ambição Literária'! Volte sempre!
Abraços, KK

BloGuidoval disse...

Pedro, também no pouco tempo que vivi em São João del Rei um dos locais preferidos a visitar era a loja de Discos (Palácio da Música) do Sô Assis. Deveria constar do roteiro cultural e turístico de SJDREI. Tenho algumas preciosidades adquiridas com o pouco do que restava do meu parco salário. Isto quando sobrava. É o LP “Mudando de Conversa” com Cyro Monteiro, Nora Ney, Clementina de Jesus e Conjunto Rosa de Ouro, lançado em 1968. Uma pérola. Toda vez que ouço este LP, eu me emociono.
E também tive a sorte de ser amigo da violonista, cantora e compositora, Cristina Assis filha do Sô Assis.

BloGuidoval disse...

Pedro, também no pouco tempo que vivi em São João del Rei um dos locais preferidos a visitar era a loja de Discos (Palácio da Música) do Sô Assis. Deveria constar do roteiro cultural e turístico de SJDREI. Tenho algumas preciosidades adquiridas com o pouco do que restava do meu parco salário. Isto quando sobrava. É o LP “Mudando de Conversa” com Cyro Monteiro, Nora Ney, Clementina de Jesus e Conjunto Rosa de Ouro, lançado em 1968. Uma pérola. Toda vez que ouço este LP, eu me emociono.
E também tive a sorte de ser amigo da violonista, cantora e compositora, Cristina Assis filha do Sô Assis.