LAPSO DO COOTIDIANO.
De repente em 1989 minha vida revirou.
Separei-me da
minha família e fui morar em um apartamento no Bairro Bonfim.
Comecei a reconstruir
minha vida remendando os cacos que sobraram.
Retirei apenas minhas
roupas e uma TV portátil da casa em que morava.
Meu apartamento passou
a ser frequentado por meus amigos que eram muitos e queridos.
Não tinha dia de
folga, todos eles o movimento na cozinha era grande. Local preferido de meus
comensais.
Contratei uma
cozinheira para atender a demanda.
A vida lhe dá uma
aula por dia. Comigo não foi diferente.
A cozinheira se
tornou para mim uma figura surpreendente, tanto que hoje estou lembrando dela
com gratidão e saudade.
Analfabeta, o que
não quer dizer sem inteligência, pelo contrário, a admirava pela sua
desenvoltura com os problemas do dia a dia.
Contou-me que
morou muitos anos no Rio de Janeiro e sua patroa era da classe A. Na condição
de analfabeta, circulou pelo Rio tomando o “lotação” pelo número. Saia de casa
com um papelzinho escrito. Mais fácil do que o nome do bairro.
Negra de certa
idade, usava o óleo de cozinha para umedecer sua pele. Nívea, nem pensar.
Entre inúmeras
qualidades, adorava uma pinga e tocar pandeiro. A pinga estava lá sempre à
disposição, porém nunca se excedeu. Com tanta admiração passei a fazer parte da
família dela, absorvendo seus problemas e ela os meus. Não me importava com o
cardápio, quando chegava para almoçar estava tudo pronto com sabor incrível.
O tempo passou e
nos tornamos amigos íntimos.
Ela era muito
esperta. Não tinha nada de boba ou lerda.
Certo dia fui ao
açougue e comprei um filé e 2kg de maçã do peito, carne de segunda própria para
cozinhar.
Então ela me
perguntou:
- Seu Pedrinho a
maçã do peito é pra mim?
Eu cheio de ironia
lhe respondi:
- Não é o filé!
No dia seguinte,
na hora do almoço vim para casa salivando um tremendo Filé ao Molho Madeira sua
especialidade.
Sentei-me à mesa e
fui surpreendido por um tremendo cozido.
Engoli em seco e
não pude falar nada.
Elogiei o cozido e
aprendi que
O BOM CABRITO NÃO
BERRA E BRONCA É ARMA DE OTÁRIO!
28/09/20
Pedro Parente.
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