terça-feira, 14 de junho de 2022

OUVIDO DE MERCADOR

 OUVIDO DE MERCADOR

Nos anos sessenta na vetusta e charmosa cidade de São João del-Rei, vivíamos tempos românticos e inocentes. Todos se conheciam, abraçavam e se tratavam pelo nome e não pelo CPF.

Desta forma a harmonia imperava entre a comunidade como se estivéssemos em uma aldeia com seus costumes simples seguindo o ritmo do rio que corta a cidade.

No carnaval a cidade se modificava. Seu ar austero dava lugar à alegria dos blocos e escolas de samba que dado à sua exuberância atraia turistas de todos estados sendo considerado o melhor do interior do Brasil.

Natural que com esse perfil, surgissem grandes mestres e compositores. Entre esses havia meu inesquecível amigo Chacal.

Funcionário do Banco do Brasil, cumpridor de suas obrigações profissionais, depois do expediente, transformava-se. 

A Agência na qual exercia sua profissão era exatamente na rua da muvuca, a famosa “Esquina do Kibon”. Quando botava os pés na calçada já vinha de dedo levantado pedindo ao proprietário do Clever’s Bar uma dose caprichada da “marvada”.

Ali se inspirava para compor lindos sambas. Alguns para Escolas de Samba. Quando a inspiração era muita, levantava-se e sapateava na ponta dos pés.

Nesse clima todos se misturavam inclusive o gerente de um Banco muito discreto e muito amigo. Era quem nos socorria nas horas de aperto que eram muitas, sempre sobrava mês e faltava salário.

Nos emprestava através de Nota Promissória a ser resgatada em 30 dias com o aval de um companheiro. As vezes não tínhamos como quitar, o bom gerente aumentava o valor do empréstimo para que sobrasse algum troco.

Essa operação, ao documento chamava-se “letra”.

Certo dia o bom gerente encontrou-se conosco na esquina e dirigiu-se ao Chacal, discretamente falou ao seu ouvido:

- Sua “letra” venceu!

- Como? Nem sabia que ela estava competindo!

Ironicamente referiu-se a letra de alguns de sus sambas.

O riso foi geral!

14/06/2022

Pedro Parente


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