segunda-feira, 17 de junho de 2024

SABARÁ

 SABARÁ

“Dom Hélder Câmara foi um dos fundadores da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em 1952, da qual foi secretário por 12 anos, e do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM), em 1955.”

Na década de 50, por iniciativa de Dom Helder foi erguida no Leblon a Cruzada São Sebastião. Um conjunto habitacional destinado a abrigar a pobreza com mais dignidade. 

Num local super valorizado ao lado de clubes da elite branca e cheirosa é claro que causou indignação aos escravocratas, porém, Dom Helder um “cabra macho” não deu ouvidos às lamúrias e construiu l0 blocos com duas alas, mais de novecentos apartamentos pequenos, mas decentes. Quem os adquiriu comprometeu apenas 15% do salário mínimo em prestações de longo prazo sob a égide do Presidente Café Filho.

Foi aí que vivi vários momentos felizes da minha vida. 

Ali morava meu amigo Sabará. Negro esguio, de físico atlético, motorista de profissão, morador respeitado no recinto. Chamavam-no pelo nome de Seu Carlos.

O apartamento era muito pequeno e abrigava a família do Sabará, dona Ana e três filhos pequenos. 

A necessidade obriga o pobre a ser criativo e dar seu jeito. A cama das crianças era armada a noite. Durante o dia eram fechadas e dependuradas na parede da sala. O casal dormia num quarto separado.

Sabará jogava vôlei conosco na nossa rede de praia onde exercia sua função com maestria, suas cortadas eram indefensáveis. 

Certo dia me convidou para o aniversário de seu filho Fabinho e que ia rolar um samba. Imaginei como seria o samba em um espaço tão pequeno. 

Então vamos lá!

Num cantinho da sala, sob uma janela havia um toca-discos e vários vinis de samba do bom. Dona Ana me recebeu de braços abertos com muito carinho e sem nenhum preconceito de cor, pois eram todos negros de quem tenho imensa saudade.

Sabará acionou o som e começamos os “trabalhos”. Cerveja, pinga e tira-gostos da Ana.

O som do samba foi atraindo a rapaziada, a birita subindo e dali a pouco a casa estava cheia. A varanda de acesso à escada era comum para todos os moradores do andar. Ali, também, virou Sambódromo. A pressão aumentando, as mocinhas dando o recado com samba no pé e ninguém parado. Sorrisos e abraços não faltavam. 

Quanta felicidade!

De repente Ana grita:

-Carlinhos! Os meninos estão trocando tiros lá embaixo!

Sabará largou tudo desceu correndo e berrou com os delinquentes: 

- Para de atirar!

Pegou as crianças no colo em segurança e ao subir a escada ordenou:

-Pode começar!

Briga de compadre. Dois pivetes cada um atrás de um pilar gastando munição que quando acabou, correu um para cada lado.

Já em casa, com as crianças a salvo o samba continuou em harmonia.

Após suculenta feijoada e já de “cara cheia” todos procuraram seu rumo.

Só restou saudade daquele dia e do amigo Sabará e sua família.

14/06/2024

Pedro Parente





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